Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013 105
Cefaleia antecedendo paralisia de Bell: Podemos
prevenir a paralisia diagnosticando e tratando
precocemente?
Headache anticipating Bell's palsy: can we prevent the facial palsy by
diagnosing and treating early?
CASE REPORTCASE REPORT
CASE REPORTCASE REPORT
CASE REPORT
RESUMORESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
A paralisia de Bell é uma paralisia facial periférica com alta
incidência, que apresenta alguns fatores associados, como a
gravidez, diabetes mellitus e hipertensão arterial, além da
infecção por alguns subtipos do vírus do herpes, o herpes
simples e o herpes zoster sine herpete. Uma característica
comum aos pacientes com a paralisia de Bell é a ocorrência
da cefaleia dias antes da instalação da paralisia, do mesmo
lado e em localização periauricular. Questiona-se, portanto,
se é possível a identificação de um padrão característico da
dor associada à paralisia e, assim, evitar a progressão da
doença ou atenuação do possível desenvolvimento do déficit
motor por se iniciar um adequado e imediato tratamento com
supressão do processo inflamatório responsável pelo acome-
timento do nervo facial. Relatamos o caso de um homem de
50 anos de idade, com paralisia facial do lado direito, com
dor na região retroauricular ipsilateral "em queimor", sem
apresentar piora durante esforço, sem náusea, vômito, foto
ou fonofobia. Aos 15 anos de idade, relatou ter apresentado
paralisia facial também do lado direito, com forte dor
retroauricular, semelhante à recidiva atual. Estamos propondo
critérios diagnósticos para a cefaleia retroauricular associada
à paralisia facial periférica idiopática.
PP
PP
P
alavrasalavras
alavrasalavras
alavras
--
--
-
chave:chave:
chave:chave:
chave: Paralisia de Bell; Cefaleia; Critérios
diagnósticos; Dor; Diagnóstico
Marcelo Moraes Valença,
1,4
Luciana Patrízia A. Andrade-Valença,
1,4
Laryssa Azevedo,
1
Mário Luciano de Mélo Silva Júnior,
1
Hugo André de Lima Martins,
1
Amanda Araújo da Silva,
1
Louana C. Silva,
1
Daniella Araújo de Oliveira
2
, Mariana de Carvalho Leal Gouveia,
3
Sílvio Caldas Neto
3
1
Unidade Funcional de Neurologia e Neurocirurgia, Departamento de Neuropsiquiatria,
2
Departamento de Fisioterapia,
3
Serviço de Otorrinolaringologia, Universidade Federal de Pernambuco,
Recife, PE, Brasil,
4
Serviço de Neurologia e Neurocirurgia, Hospital Esperança, Recife, PE, Brasil
Valença MM, Andrade-Valença LP, Azevedo L, Silva Júnior ML, Martins HA, Silva AA, Silva LC, Oliveira DA,
Gouveia MC, Caldas Neto S. Cefaleia antecedendo paralisia de Bell: Podemos prevenir a
paralisia diagnosticando e tratando precocemente? Headache Medicine. 2013;4(4):105-11
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT
Bell's palsy is a peripheral facial palsy with high incidence,
which has some associated factors such as pregnancy, diabetes
mellitus and hypertension, in addition to infection by some
subtypes of the herpes virus, i.e. herpes simplex and herpes
zoster sine herpete. A common feature of patients with Bell's
palsy is the occurrence of ipsilateral headache of periauricular
location, days before the onset of the paralysis. It is
questionable, therefore, whether it is possible to identify a
characteristic pattern of this pain in order to prevent disease
progression or mitigate the possible development of motor
deficit by initiating appropriate and immediate treatment to
suppress the inflammatory process of the facial nerve. We
report the case of a 50-year-old man with facial palsy on the
right side, with pain in the ipsilateral retroauricular. At the age
of 15 he reported a previous episode of facial palsy, also on
the right side, with severe retroauricular pain, similar to the
current recurrence. We propose diagnostic criteria for the
retroauricular headache associated with idiopathic peripheral
facial palsy.
Keywords: Keywords:
Keywords: Keywords:
Keywords: Facial palsy; Diagnostic criteria; Diagnosis;
Headache
106 Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013
VALENÇA MM, ANDRADE-VALENÇA LP, AZEVEDO L, SILVA JÚNIOR ML, MARTINS HA, SILVA AA, ET AL.
INTRODUÇÃO
Muitos pacientes com paralisia facial periférica de
Bell apresentam cefaleia dias antes da instalação da
paralisia.
(1)
Essa cefaleia ocorre no mesmo lado da
paralisia e é de localização periauricular.
A paralisia de Bell é a mais comum neuropatia
craniana,
(2)
com incidência alta (10-30 indivíduos/
100,000/ano). Gravidez, diabetes mellitus e hipertensão
arterial são descritos como fatores associados.
(3-7)
Muitas
vezes infere-se que infecção pelo herpes simples
(8)
pode
ser o motivo da paralisia e o herpes zoster, na sua forma
zoster sine herpete,
(9)
pode causar paralisia do sétimo
nervo craniano (em 6,9% dos casos)
(1)
clinicamente
semelhante à forma idiopática (de causa indeterminada)
da paralisia facial periférica que chamamos de paralisia
de Bell.
(1,10)
Nesse sentido, quando encontramos as lesões
cutâneas, caracterizadas por pequenas vesículas, no
conduto auditivo externo, pavilhão auricular e palato
associadas com paralisia facial periférica, o diagnóstico
da síndrome de Ramsay-Hunt
(11,12)
causada pelo herpes
zoster se torna fácil.
A instalação da paralisia é repentina e não se pode
prever o início do quadro paralítico por não haver pró-
domo, com exceção da dor que, em muitos indivíduos,
antecede em vários dias o déficit motor.
Diante desse fato, questionamos se podemos
identificar algumas características da dor associada com
a paralisia facial periférica, de forma que um diagnóstico
precoce e o pronto tratamento com corticoide e antiviral
evitaria a progressão da doença, impedindo ou atenu-
ando o possível desenvolvimento do déficit motor por
acometimento do nervo facial.
Neste artigo descrevemos o caso de um paciente
que apresentou recidiva de uma paralisia facial periférica
que foi antecedida por dor intensa na região periauricular
ipsilateral.
RELATO DO CASO
Homem com 50 anos de idade procurou a emer-
gência do Hospital Esperança, Recife, referindo paralisia
do lado direito da face. Cinco dias antes da instalação
da paralisia surgiu dor na região retroauricular direita
"em queimor" (Figura 1), não pulsátil, contínua, cuja
intensidade variava entre 4 e 9/10, não piorava no
esforço, sem náusea ou vômito, foto ou fonofobia. A
dor persistiu até sete dias após o aparecimento da
paralisia, mesmo durante o uso do corticoide. Relatou
cefaleia do tipo tensional em raras ocasiões. Ao exame
observou-se paralisia facial periférica total do lado
direito (escala de House-Brackmann grau VI), com
preservação do lacrimejamento. Mencionava
hiperacusia. Foi medicado com prednisona e aciclovir
por 10 dias e recomendada uma proteção do olho
direito. Passado de hipertensão arterial leve em uso
contínuo de captopril.
O paciente informou que aos 15 anos de idade
apresentou paralisia facial periférica também do lado
direito, antecedida por dor forte retroauricular
semelhante à que ocorreu na recidiva atual. Uma tia
sua também apresentou dois episódios de paralisia
facial periférica.
Dois meses após o início da paralisia houve recu-
peração praticamente completa do déficit motor,
porém o paciente ainda percebe hiperacusia, ainda
que mais leve. No nono dia após a paralisia facial o
paciente foi submetido a um exame por ressonância
magnética do encéfalo sem contraste que foi
considerado normal (Figura 2).
Figura 1. Local da dor (retroauricular) mencionado pelo paciente.
Desenho de Laryssa Azevedo
Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013 107
CEFALEIA ANTECEDENDO PARALISIA DE BELL: PODEMOS PREVENIR A PARALISIA DIAGNOSTICANDO E TRATANDO PRECOCEMENTE?
referiam dor retroauricular a dor precedeu a paralisia
1-12 dias. Em apenas dois pacientes a dor surgiu após
a paralisia facial. Baseado em provas sorológicas (anti-
corpos IgG e IgM para vírus vericella-zoster, quatro
(6,9%) dos 58 pacientes foram considerados como
apresentando herpes zoster sine herpete. A dor foi muito
mais frequente nos pacientes com zoster sine herpete
(4/4, 100%) em relação à paralisia idiopática (22/54,
40,6%) (odds ratio 13,0, IC 95% 0,67-253,8). Esses
autores
(1)
também observaram que, quando o intervalo
entre a dor retroauricular e a paralisia foi maior ou igual
a quatro dias, o prognóstico da recuperação da paralisia
foi melhor. Eles acreditam que a dor retroauricular deve
ser causada por uma neuralgia herpética, inflamação
do nervo, incluindo gânglio geniculado e/ou edema
do nervo facial com pressão no canal ósseo do facial.
Considerando a fisiopatogenia acima comentada,
poderíamos afirmar que a paralisia facial de Bell seria
uma síndrome compartimental, i.e. uma elevação da
pressão dentro de um espaço anatômico limitado que
causaria diminuição significativa da perfusão sanguínea
de estruturas que trafegam por ele, como no exemplo o
nervo facial.
Perguntamos também se haveria maior susceti-
bilidade individual quando o espaço no canal ósseo for
pequeno em relação ao sétimo nervo (e.g. estenose do
canal de Falópio ou do conduto auditivo interno)
(12)
com
risco maior de dano neural no caso de edema, com-
pressão e hipóxia do nervo facial. Se isso for verdade,
alguns pacientes podem apenas apresentar dor retro-
auricular sem o acometimento paralítico do sétimo nervo
craniano quando este espaço for bem maior do que o
volume do nervo.
Berg e colaboradores
(2)
estimam que 33% a 70%
dos pacientes com paralisa de Bell referiam na fase
aguda dor ipsilateral envolvendo as regiões
periauricular, da face ou do pescoço. Em seus 826
pacientes com paralisia de Bell, 412 (50%)
apresentaram dor ipsilateral dentro das 72 horas do
início da paralisia, e 128/717 (18%) ainda
apresentavam dor ipsilateral após um mês de seguimento
ambulatorial.
(2)
Além disso, 0,8% (6/717) e 0,9% (6/
637) dos pacientes apresentaram a dor tardiamente,
um mês e dois meses, respectivamente, após a
instalação do déficit. Isso sugere que a dor pode
aparecer semanas após o aparecimento da paralisia.
Todavia o tratamento com prednisolona ou valacyclovir
não influenciou a incidência ou intensidade da dor.
Em outro estudo
(14)
também não foi observado efeito
Figura 2. Corte coronal de um exame por ressonância magnética do
crânio mostrando os condutos auditivos internos
DISCUSSÃO
Neste artigo, relatando um caso clínico, estamos
lançando a ideia de que seria possível se chegar a um
diagnóstico da cefaleia que antecederia a paralisia facial
periférica idiopática estudando suas características, e,
desta forma, por ser peculiar entre outros tipos de
cefaleias teríamos tempo de iniciar uma estratégia
terapêutica de proteção do nervo facial, prevenindo um
possível dano funcional do nervo facial que ocorreria
horas ou dias após.
Em estudo preliminar estudamos retrospectivamente
o prontuário de 31 pacientes com paralisia facial
periférica idiopática que foram atendidos no Serviço
de Eletroneuromigrafia da Unidade Funcional de
Neurologia e Neurocirurgia do Hospital das Clínicas
da Universidade Federal de Pernambuco.
(13)
Desses
pacientes, 22 (71%) referiam cefaleia antes do
surgimento da paralisia e sete (23%) afirmaram que a
cefaleia surgiu no dia da instalação do déficit motor
facial. Nesse grupo, o intervalo entre a dor e o início
da paralisia foi de 2,7 ± 2,0 dias (0-7 dias). Dor leve
foi referida por 14 pacientes; moderada, por um, e
forte, por sete.
Chida e colegas
(1)
estudaram 58 pacientes com
paralisia de Bell e 26 (44,8%) tinham queixa de dor
retroauricular ipsilateral. Em 21 pacientes dos 26 que
108 Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013
VALENÇA MM, ANDRADE-VALENÇA LP, AZEVEDO L, SILVA JÚNIOR ML, MARTINS HA, SILVA AA, ET AL.
Figura 3. Corte coronal de um exame por ressonância magnética de uma mulher que apresentou paralisia facial periférica associada com dor
retroauricular com recuperação espontânea. Seta mostra presença de neoplasia no osso temporal esquerdo
benéfico do tratamento com prednisona sobre a dor.
Porém, em estudo
(15)
não randomizado houve sugestão
de benefício do uso do corticoide sobre a dor, pelo
fato dos pacientes relatarem retorno da dor com a
retirada da prednisona. Pacientes com dor que ocorre
entre o 11° a 17° dia após a paralisia parecem ter um
prognóstico pior em relação à recuperação do déficit
motor.
Em estudo por ressonância magnética do segmento
no nervo facial que trafega através do conduto auditivo
interno distal, gânglio geniculado, tímpano e mastoide,
Jun e colegas
(16)
observaram em um grupo de 44 paci-
entes com paralisia de Bell, que no lado da paralisia
havia um maior grau de captação do contraste pelo
gânglio geniculado quando comparado com o lado
contralateral, sugerindo que o gânglio geniculado é o
segmento do nervo facial mais acometido no processo
fisiopatogênico da paralisia de Bell. Esse maior realce
do nervo que ocorre após a infusão do gadolínio é
entendido como inflamação e edema, pela quebra de
barreira. Na interpretação do resultado de um exame
por ressonância magnética é importante destacar que,
em indivíduos normais, pode haver captação do contraste
pelo nervo facial,
(17)
daí a importância de se comparar
com a área contralateral. No entanto, o grau de captação
do contraste pelo nervo facial não apresentou correlação
com o prognóstico final (duração média do seguimento
ambulatorial dos pacientes foi de 13,5 meses).
(16)
Esses
autores concluem, portanto, que a realização de uma
ressonância magnética do osso temporal não se faz
necessária. Todavia, nós acreditamos que uma inves-
tigação por ressonância magnética com uso do gadolínio
seja necessária porque não é raro se encontrar casos de
paralisia facial periférica de instalação aguda com
recuperação completa espontânea e, anos após, na
recidiva, se chegar ao diagnóstico de um processo
neoplásico como causa. Na Figura 3 mostramos o caso
de uma mulher que, aos 25 anos de idade, apresentou
paralisia facial periférica esquerda acompanhada por
dor retroauricular (iniciada no momento da paralisia cuja
duração foi de um dia), havendo recuperação completa
da paralisia após três meses. Três anos após houve
recidiva da paralisia no mesmo lado, desta vez sem dor
e sem recuperação. Na investigação diagnosticou-se um
volumoso tumor glômico.
Dor retroauricular foi considerada como fator predi-
tivo de mau prognóstico.
(18)
Outros indicadores de que
pode haver uma recuperação parcial do déficit motor
são: idade avançada, pressão arterial sistólica alta,
alteração no lacrimejamento, queimor no olho, gosto
alterado, grau elevado no House-Brackmann, atraso no
início da terapia com corticoide ou o não uso do
corticoide.
(5,18)
A dor retroauricular pode recorrer tempo depois da
paralisia de Bell, como nos dois casos descritos por
Jacome
(19)
de mulheres que referiam o ressurgimento de
dor durante a menstruação.
Fisiopatogenia da dorFisiopatogenia da dor
Fisiopatogenia da dorFisiopatogenia da dor
Fisiopatogenia da dor
Partido do pressumposto que os nervi nervorum
inervam as bainhas do nervo facial.
Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013 109
Han
(20)
explica o fato da dor na paralisia de Bell se
localizar na região periauricular por ser uma dor referida
pelo acometimento das bainhas do nervo facial, mani-
festando-se ao longo do segundo arco branquial com
uma distribuição metamérica primária.
O nervo intermédio de Wrisberg contém fibras sen-
sitivas, sensoriais e parassimpáticas (fibras envolvidas na
gustação dos dois terços anteriores da língua e fibras
secretomotoras das glândulas lacrimal e salivar) e no
gânglio geniculado ele se junta à parte motora do nervo
facial. As fibras sensitivas trazem informação da orelha
externa, mucosa da nasofaringe (palato) e nariz. No
gânglio geniculado estão localizados os corpos neuronais
das fibras sensitivas do nervo facial, responsáveis pelo
meato auditivo externo e grande parte do pavilhão
auricular.
Semiologia e nível de lesão do nervo facialSemiologia e nível de lesão do nervo facial
Semiologia e nível de lesão do nervo facialSemiologia e nível de lesão do nervo facial
Semiologia e nível de lesão do nervo facial
Do ponto de vista clínico e prático podemos localizar
a região do nervo facial onde houve acometimento. A
lesão do nervo facial quer no tronco cerebral ou ao longo
do seu trajeto periférico pode resultar na paralisia dos
movimentos faciais do mesmo lado, e muitas vezes
perturbações da sensibilidade gustativa e das funções
secretoras. Assim, uma lesão do nervo na saída do forame
estilomastoideo provocaria paralisia de todos os
movimentos faciais daquele lado (e.g. não se franze a
testa, nem se fecha o olho, ou mesmo se mostra os dentes
adequadamente). Dessa forma somente haveria déficit
motor.
(7)
Quando a lesão ocorre mais alta, mas distal ao
gânglio geniculado, o déficit motor persiste, porém
associado a uma alteração da secreção das glândulas
salivares sublinguais e submandibulares. Há também
hiperacusia e, às vezes, uma perturbação da gustação
dos dois terços anteriores da hemilíngua ipsilateral.
Explica-se a secreção salivar anormal pela interrupção
das fibras parassimpáticas pré-ganglionares proveni-
entes do núcleo salivar superior. A hiperacusia é
motivada pela paralisia do músculo estapédio, que
tem a função de amortecer oscilações dos ossículos
do ouvido médio.
(7)
Assim sendo, o indivíduo se queixa
do timbre desconfortável de sons que antes não
incomodavam, como o toque do telefone. Interessante
notar que tal fenômeno somente ocorre se o sétimo
nervo craniano for lesado na sua periferia, não apa-
recendo quando a lesão se estabelece no tronco cere-
bral. Nem sempre a gustação está alterada, pois algu-
mas fibras podem tomar um trajeto aberrante e acom-
panhar o nervo grande petroso.
(7)
Esse local de acome-
timento do nervo facial deve ter ocorrido no caso apre-
sentado agora, pois nosso paciente referia hiperacusia
e negava distúrbios da gustação e da secreção
lacrimal.
Se a lesão do nervo facial se posiciona na porção
proximal ao gânglio geniculado, o paciente apresen-
taria todos os sinais descritos acima e invariavelmente
teria perda completa da gustação dos dois terços ante-
riores da língua. O lacrimejamento (epífora) também
estaria alterado no lado da lesão (destruição das fibras
parassimpáticas do gânglio esfenopalatino ou pterio-
palatino).
Como informação importante anatomofuncional,
vale citar que o nervo facial que trafega pelo canal facial
emite um ramo (o nervo petroso superficial maior) para
o gânglio esfenopalatino logo após o gânglio geni-
culado. Mais distalmente um novo ramo parte do nervo
facial, que se junta ao nervo corda do tímpano, que
segue em direção ao músculo estapédio (músculo do
estribo).
RecorrênciaRecorrência
RecorrênciaRecorrência
Recorrência
Pode haver recorrência da paralisia facial periférica
idiopática em 7% a 15% dos casos, denominando-se
tais casos como forma recorrente, recidivante, "em
bascule" ou alternante.
(3,21,22)
Alguns autores chamam de
recidivante quando ocorre no mesmo lado da face, e
alternante quando ocorre no lado oposto da face, nas
paralisias faciais consecutivas recorrentes.
(21)
Em estudo nosso anterior
(21)
envolvendo 190 paci-
entes, houve 209 episódios de paralisia facial periférica,
sendo 16 recorrências (8,4%) e, em um dos indivíduos
estudados, a paralisia se instalou bilateralmente, havendo
recidiva no lado direito 3 anos após o primeiro episódio.
O intervalo de tempo entre o primeiro evento e o segundo
foi de 45 ± 50 meses (mediana de 18 meses, mínimo 3
meses, máximo 13 anos). Em 57% dos pacientes a
recidiva ocorreu até 2 anos após a primeira paralisia.
Em dois pacientes houve uma terceira recidiva 5 meses e
6 anos, respectivamente, após a segunda recidiva. Das
18 recorrências 72% ocorreram no mesmo lado.
(21)
A grande maioria das recorrências é da forma idio-
pática, porém devemos lembrar que recorrências podem
acontecer na síndrome de Melkersson Rosenthal, no
neurinoma do nervo facial e na otite média, como bem
escrevem Li e colaboradores.
(23)
CEFALEIA ANTECEDENDO PARALISIA DE BELL: PODEMOS PREVENIR A PARALISIA DIAGNOSTICANDO E TRATANDO PRECOCEMENTE?
110 Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013
Li e colaboradores
(23)
afirmam que na recidiva da
paralisia facial periférica há uma tendência de haver
mais sequelas vinculadas a uma recuperação parcial
do déficit neurológico.
(24)
Por causa do risco de sequela
e pela relativa alta chance de haver outra recorrência,
alguns autores recomendam a realização de proce-
dimento cirúrgico descompressivo sobre o nervo facial
para aqueles indivíduos que apresentaram pelo menos
dois episódios da paralisia facial periférica.
(23,25,26)
Evidência mostra que o risco de haver recorrência
aumenta de 15% no segundo episódio para 50% no
quarto evento.
(23,27)
Apesar do procedimento continuar
a ser realizado até os dias atuais,
(23)
ainda há con-
trovérsia sobre como realizar a descompressão e acre-
ditamos não haver consenso sobre a indicação de tal
procedimento cirúrgico.
Critérios para cefaleia retroauricularCritérios para cefaleia retroauricular
Critérios para cefaleia retroauricularCritérios para cefaleia retroauricular
Critérios para cefaleia retroauricular
associada à paralisia facial periféricaassociada à paralisia facial periférica
associada à paralisia facial periféricaassociada à paralisia facial periférica
associada à paralisia facial periférica
Com base na informação encontrada na
literatura
(1,2)
entendemos que a dor é estritamente
unilateral, contínua por varias horas ou dias, de
intensidade variável no mesmo indivíduo (flutua de
intensidade ao longo do dia), referida como queimante,
surda, não pulsátil, localizada preferentemente na
região retroauricular. O exame físico da cabeça,
incluindo avaliação otológica do paciente, não revela
anormalidade. Não há febre.
Diante do exposto acima, tentaremos criar critérios
diagnósticos para a cefaleia retroauricular associada à
paralisia facial periférica de Bell:
A. Dor retroauricular ou periauricular, que pode se
estender para regiões do pescoço e face homolaterais;
B. Dor contínua, porém com variação na intensi-
dade, por mais de oito horas;
C. Sem evidência de processo inflamatório visível
periauricular;
D. Nunca sentiu esse tipo de dor antes ou dor com
características semelhantes à percebida na ocasião da
paralisia facial prévia, se assim for o caso;
E. Não preenche nenhum dos critérios para outro
tipo de cefaleia listada no ICDH-3 Beta.
Desta forma, quando um paciente preencher esses
critérios diagnósticos gostaríamos de sugerir o uso de
corticoide "preventivo" no sentido de atenuar o processo
inflamatório e progressão para uma paralisia facial
periférica, principalmente naqueles pacientes com história
de paralisia facial periférica anterior.
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VALENÇA MM, ANDRADE-VALENÇA LP, AZEVEDO L, SILVA JÚNIOR ML, MARTINS HA, SILVA AA, ET AL.
Headache Medicine, v.4, n.4, p.105-111, Oct./Nov./Dec. 2013 111
Correspondência
Marcelo M. VMarcelo M. V
Marcelo M. VMarcelo M. V
Marcelo M. V
alença, MDalença, MD
alença, MDalença, MD
alença, MD
, PhD, PhD
, PhD, PhD
, PhD
mmvalenca@yahoo.com.br
Received: December 5, 2013
Accepted: December 20, 2013
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CEFALEIA ANTECEDENDO PARALISIA DE BELL: PODEMOS PREVENIR A PARALISIA DIAGNOSTICANDO E TRATANDO PRECOCEMENTE?