Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013 25
Comorbidades psiquiátricas em pacientes de
cefaleias primárias
Psychiatric comorbidities in patients with primary headache
VIEW AND REVIEWVIEW AND REVIEW
VIEW AND REVIEWVIEW AND REVIEW
VIEW AND REVIEW
Camila Cordeiro dos Santos
1
, Glauce Regina Lippi
2
1
Aluna do Programa de Mestrado em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento, Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE), Recife - PE, Brasil. Núcleo de Neurociência - Departamento de Pós-Graduação Lato
Sensu, Faculdade de Ciências Humanas ESUDA, Recife - PE, Brasil
2
Aluna do Programa de Mestrado em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento, Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE), Recife - PE, Brasil. Fonoaudióloga da Memóriativa, Ambulatório de
Neurologia Cognitiva e do Comportamento, Hospital Geral de Areias, Recife -PE, Brasil
Santos CC, Lippi GR. Comorbidades psiquiátricas em pacientes de cefaleias primárias.
Headache Medicine. 2013;4(1):25-30
RESUMORESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
O presente estudo buscou realizar uma revisão não
sistemática de publicações referentes à cefaleia e
comorbidades psiquiátricas. É constatado que a cefaleia
possui várias comorbidades, incluindo depressão e
ansiedade. Cerca de 30% de portadores de cefaleia
apresentam quadros depressivos e 60% apresentam
sintomatologia ansiosa. Acredita-se que a própria
fisiopatologia da cefaleia possa ser favorável ao
desenvolvimento dessas comorbidades. Além disso, o
desconforto e as dores causadas pela cefaleia que muitas
vezes limita o paciente no exercício de suas atividades diárias
também funcionem como fatores predisponentes a essas
comorbidades. Ressalta-se também a importância do
conhecimento adequado do médico sobre a sintomatologia
dessas comorbidades e que este facilite o diagnóstico e um
tratamento eficiente no controle e/ou remissão dos sintomas.
Neste contexto, o presente estudo busca oferecer informações
baseadas em estudos realizados com pacientes portadores
de cefaleia com o objetivo de descrever os tratamentos atuais
e novas descobertas a respeito da cefaleia, favorecendo assim
melhor compreensão da referida patologia bem como os
impactos causados por suas comorbidades, e estratégias
que possibilitem melhor qualidade de vida aos pacientes
que convivem com a cefaleia frequentemente.
PP
PP
P
alavrasalavras
alavrasalavras
alavras
--
--
-
chaves:chaves:
chaves:chaves:
chaves: Cefaleia; Comorbidade psiquiátrica;
Depressão
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT
This study sought to conduct a non-systematic review of
publications related to headache and psychiatric comorbidity.
It is noted that headache has several comorbidities, including
depression and anxiety. About 30% of headache patients
have depression and 60% have anxiety symptoms. It is
believed that the pathophysiology of headache may be
conducive to the development of these comorbidities.
Furthermore, the discomfort and pain caused by headaches
that often limits the patient ability to perform activities of
daily living also act as predisposing factors for these
comorbidities. It is also emphasized the importance of
adequate knowledge about these symptoms and comorbidities
by the doctor in order to facilitate the diagnosis and offer
effective treatment in controlling and/or remission of the
symptoms. In this context, this study seeks to provide
information based on studies of headache patients in order
to describe the current treatments and new discoveries
concerning headache, thus promoting better understanding
of said pathology as well as the impacts of their comorbidities
and strategies that will enable better quality of life for patients
living with frequent headaches.
KK
KK
K
eywords:eywords:
eywords:eywords:
eywords: Headache, psychiatric comorbidity, depression
26 Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013
SANTOS CC, LIPPI GR
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, as doenças crônicas vêm desem-
penhando um grande papel em nossa sociedade,
acometendo não só idosos, mas também, jovens em
idade produtiva. Dentre as doenças crônicas mais
conhecidas, destaca-se a cefaleia, que embora, bem
estudada e conhecida, ainda hoje se faz presente na
vida de milhões de pessoas exercendo seu impacto na
qualidade de vida das pessoas acometidas.
Recentes estudos apontam que muitos pacientes com
cefaleia apresentam diversos sintomas psicopatológicos
quando comparados com a população sem cefaleia.
Sua prevalência é alarmante, acometendo homens e
mulheres de diversas idades e classes sociais, sendo
mais prevalente, porém, em mulheres.
Resultados obtidos em pesquisas demonstram que
pacientes com cefaleia são mais suscetíveis a apre-
sentarem sintomatologia ansiosa e depressiva. Estudiosos
referem que a própria fisiopatologia da cefaleia pode
estar relacionada ao surgimento dos sintomas depres-
sivos e ansiosos, além da própria qualidade de vida
que se mostra comprometida, principalmente nas esferas
sociais e ocupacionais, restringindo cada vez mais as
atividades cotidianas dos sujeitos.
Isso nos leva a inferir que, assim como a cefaleia,
suas comorbidades como depressão e ansiedade,
também precisam ser tratadas adequadamente, uma
vez que estas patologias também interferem na funcio-
nalidade do sujeito em seu meio. A negligência no
tratamento dessas desordens psíquicas pode contribuir
para uma má qualidade de vida dos pacientes acome-
tidos.
Este estudo tem como objetivo descrever a asso-
ciação da cefaleia com a depressão e ansiedade,
baseado nos resultados de pesquisas atuais e sugerir
métodos de tratamentos adequados e eficazes com o
objetivo de promover a saúde e qualidade de vida dos
pacientes em questão.
CEFALEIA E COMORBIDADE PSIQUIÁTRICA
Cefaleia é um termo médico utilizado para designar
a dor de cabeça. É uma das principais queixas atuais
nos consultórios médicos. Muitos desses pacientes são
tratados farmacologicamente, contudo, boa parte desses
fármacos possuem efeitos indesejáveis que aumentam
quando utilizados em longo prazo, interferindo nas esferas
emocionais, cognitivas e comportamentais.
(1,2)
O
conhecimento adequado da fisiopatologia do tipo da
cefaleia em questão oferece subsídios importantes para
o médico prescrever o medicamento apropriado para
cada tipo de paciente, evitando então efeitos colaterais
desnecessários e auxilie na promoção da qualidade
de vida do mesmo.
(2)
As cefaleias podem ser classificadas em primárias
ou secundárias. Quando falamos em cefaleia primária,
nos referimos àquelas cefaleias que ocorrem sem uma
doença de base, como por exemplo: cefaleia tensional,
cefaleia em salvas, migrânea, entre outras. As cefaleias
secundárias correspondem às cefaleias que ocorrem
devido a uma condição clínica anterior à cefaleia, como
tumores cerebrais, acidente vascular cerebral, hidro-
cefalia, traumatismo craniano, etc.
(3,4)
Estudos populacionais indicam uma prevalência de
10% a 15%, podendo variar de acordo com a popu-
lação estudada de pacientes portadores de migrânea,
a mais conhecida e mais estudada cefaleia primária,
embora estudos com a população brasileira sejam
relativamente poucos quando comparados a publi-
cações internacionais; acredita-se que a prevalência da
migrânea seja semelhante a dados americanos. Afeta
três vezes mais mulheres do que homens e apresenta-se
mais frequente entre os 25-34 anos em mulheres e 55-
64 anos nos homens.
(5)
A cefaleia apresenta etiologia multifatorial. É
possível verificar que alguns casos de cefaleia apre-
sentam alterações estruturais nervosas e extranervosas,
sistêmicas ou quadros disfuncionais.
(3,6)
Seu diagnóstico
é realizado após criteriosa avaliação clínica, histórico
familiar, uma vez que observa-se alta incidência de
migrânea em pessoas cujo histórico familiar é positivo
para a patologia em cerca de 55%. Exames de imagem,
como, por exemplo, tomografia e/ou ressonância mag-
nética de crânio, exames laboratoriais com análise do
líquor e sangue, entre outros, a fim de auxiliar o diag-
nóstico diferencial e excluir doenças que possam
produzir sintomatologia semelhante, como também para
verificar se a cefaleia é subjacente a uma condição
clínica pré-existente, que neste caso se configuraria como
uma cefaleia secundária.
(6)
Comorbidade é um termo que se refere a condições
clínicas distintas em um mesmo paciente. Esta associação
ocorre de forma provavelmente não causal, entre uma
doença inicial e uma ou mais doenças físicas ou
psicológicas. O termo comorbidity foi cunhado por
Feinstein em 1970 para definir a coexistência de mais
de uma condição mórbida numa mesma pessoa.
Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013 27
Muitas vezes, entretanto, há o desconhecimento de
possíveis comorbidades, podendo levar ao erro na
identificação de uma afecção e as características de
uma outra subjacente, porém ignorada. A importância
em observar essas possíveis comorbidades reside no
fato de que as mesmas dificultem o diagnóstico e
posteriormente o tratamento.
(7)
Baseado em estudos clínicos e observações,
conclui-se que pacientes com migrânea têm cerca de
cinco vezes mais chances de apresentar comorbidades
quando comparados a sujeitos controles.
(8)
Abaixo, o
Quadro 1 demonstra as comorbidades mais frequentes
em migrânea, vale ressaltar que o mesmo encontra-se
ainda em crescimento, relacionando-se a doenças
neurológicas, psiquiátricas e sistêmicas.
(9,10)
Em determinada revisão, o autor destaca as dificul-
dades e limitações que os estudos retrospectivos apre-
sentam em relação ao estudo das comorbidades em
migrânea, dentre as quais enfatiza o pequeno tamanho
de amostras, a qualidade (representa apenas uma parte
da população) e muitas vezes a inexistência de um grupo
controle para verificação e comparação dos dados.
(12)
O mesmo autor ainda refere que muitos estudos
foram realizados antes da classificação da International
Headache Society com sua primeira edição em 1988,
posteriormente reclassificada em 2004, o que dificulta
muitas vezes uma compreensão e diagnóstico mais claro
devido a grande variabilidade das definições de migrâ-
nea empregadas.
(12)
Os estudos sobre a prevalência e incidência dos
transtornos podem ser realizados em populações gerais
e clínicas. Estudos populacionais apresentam vieses de
seleção diminuídos, entretanto, estudos em populações
clínicas podem reforçar os dados obtidos e auxiliar no
monitoramento do curso evolutivo, bem como as
comorbidades e ainda verificar a eficácia do tratamento.
As comorbidades entre as patologias podem
apresentar-se de forma uni ou bidirecional, como no caso
da depressão que aumenta o risco do surgimento da
migrânea, e esta o risco da depressão, sugerindo,
portanto, partilharem de uma etiologia em comum, alguns
autores enfatizam que a hipofunção das atividades
serotoninérgicas seria uma possibilidade etiológica em
comum.
(13)
Estudos sobre epilepsia por sua vez,
demonstram que a aparecimento da migrânea, facilitaria
o surgimento da epilepsia e vice-versa apontando fatores
genéticos e provavelmente a excitabilidade neuronal
como sendo responsáveis pela etiologia.
(12)
O tratamento da migrânea é geralmente influ-
enciado pelas comorbidades apresentadas contribuindo
para uma resposta mais fraca ao tratamento. Acredita-
se que as comorbidades podem representar oportu-
nidades, quando uma única medicação pode ser eficiente
para ambas, ou limitações, quando a medicação pode
ser útil em uma doença e contra-indicada para outra.
Sobretudo, o erro muitas vezes ressalta numa má obser-
vação do quadro clínico, sua evolução e no desco-
nhecimento de comorbidades, o que dificultaria um diag-
nóstico correto.
(7)
CEFALEIA, DEPRESSÃO E ANSIEDADE
Wolf, em 1937 realizou um dos primeiros estudos
que demonstravam uma associação entre cefaleias e
Essas afeccoes secundárias podem aparecer como
um transtorno (alterações comportamentais e psicológicas)
e/ou doença (entidades clínicas definidas).
Comorbidades podem existir entre transtornos de
grupos diagnósticos diferenciados, como por exemplo,
depressão e migrânea, ou entre transtornos do mesmo
grupo, no caso, depressão e distimia. A análise cuida-
dosa permite o estudo da etiologia, evolução e prog-
nóstico do quadro apresentado, fornecendo subsídios
importantes para o auxílio na prescrição do tratamento
adequado.
(11)
Outro fato que vale a pena ser ressaltado é o
impacto na qualidade de vida que pessoas portadoras
de migrânea e comorbidades exercem sobre o
paciente. Estudos demonstram que pacientes
migranosos possuem um custo de assistência médica
60% maior do que os não migranosos, sugerindo que
as comorbidades possivelmente seriam responsáveis
por este aumento.
(8)
As comorbidades, de acordo com
os estudiosos exerceriam um aumento em cerca de
33%, comprometendo significativamente a qualidade
de vida dos pacientes .
COMORBIDADES PSIQUIÁTRICAS EM PACIENTES DE CEFALEIAS PRIMÁRIAS
28 Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013
SANTOS CC, LIPPI GR
transtornos psiquiátrico, no qual denominou o termo
personalidade migranosa para caracterizar pacientes
migranosos que apresentavam comportamentos perfec-
cionistas, obsessivos, e de personalidade inflexível.
(14)
Embora não mais utilizado, este termo deu início a uma
vasta investigação posteriormente entre a correlação de
cefaleias e quadros psiquiátricos.
A maioria das características psicológicas apre-
sentadas pelos pacientes migranosos pode ser melhores
definidas como sintomas psicopatológicos ao invés de
traços de personalidade.
(15)
Estudos apontam que em
pacientes com quadros intensos de cefaleia, apresentavam
altos níveis de comorbidade psiquiátrica.
(16-19)
Em estudos
com familiares, foram encontrados não apenas grande
associação positiva para migrânea entre familiares como
também a depressão foi fortemente relacionada, diferen-
temente dos achados em grupos de pessoas sadias.
(15)
Estudos em crianças e adolescentes identificaram
sinais de instabilidade emocional, imaturidade mental,
ansiedade e depressão quando comparadas a grupos
controles. Estudos com jovens adultos conseguiram
replicar os mesmos achados, sobretudo os transtornos
psiquiátricos.
(20)
Pesquisas recentes referem que a cefaleia apresenta-
se duas vezes mais frequentes em adolescentes com
depressão, e que o surgimento da depressão maior na
adolescência era preditiva de cefaleia em adultos jovens
conforme os critérios diagnósticos do DSM IV (Diagnostic
and Statistical Manual of Mental Disorders, 1994). Abaixo
o quadro com os critérios da referida classificação, para
o diagnóstico de depressão é necessário que cinco dos
sintomas listados deva estar presentes, dentre os quais o
estado deprimido ou falta de motivação deva estar
presente há pelo menos duas semanas.
Atualmente acredita-se que pacientes com migrânea
apresentam o risco de 30% a mais de desenvolverem
depressão do que pessoas sem migrânea (10%), enfa-
tizando que pacientes migranosos tem o risco três vezes
maior de apresentar depressão do que os não migra-
nosos, através de estudos populacionais, a associação
entre a depressão e migrânea encontra-se bem estabe-
lecida, o que foi replicado em estudos clínicos e epide-
miológicos, possuindo prevalências semelhantes em
migrânea (mulheres 24%, homens 9%) e depressão maior
(mulheres 24% e homens 13%).
(15,16,21)
Estudos referem o grande sofrimento vivenciado por
pacientes deprimidos, seja pelos seus sintomas, como
também pelo prejuízo causado pela depressão. Em muitos
casos é possível observar alterações em sua dinâmica
social e laboral.
(22,23)
Percebe-se que apesar de poder
acometer indivíduos nas mais variadas faixas etárias, a
depressão é mais prevalente em idades médias, nas quais
os indivíduos, estudam, trabalham e formam novos
grupos familiares, devido a isto, muitas vezes o impacto
causado pela depressão em seu cotidiano e qualidade
de vida assume dimensões imensas.
(23,24)
O diagnóstico da depressão pode ser auxiliado
através da utilização de escalas e inventários como os
de Beck (BDI), Montgomery-Asberg e Hamilton, escalas
muito utilizadas em estudos clínicos e epidemiológicos,
possuindo grande sensibilidade para a depressão.
(25)
Em relação à ansiedade, percebemos uma alta
prevalência em pessoas com cefaleia, principalmente em
pacientes com cefaleia do tipo tensional crônica, cefaleia
mista e cefaleia por abuso de analgésicos.
(26)
A ansiedade é considerada um transtorno com sinais
e sintomas bem definidos. Em portadores de cefaleia, a
ansiedade possui a alarmante prevalência de 60%, os
dados são baseados em estudos realizados com o
Inventário de ansiedade de Beck, entre outras escalas.
(27,28)
Muitos pacientes referem grande receio ansiogênico
de serem portadores de doenças mais graves, como
tumores cerebrais ou doenças cerebrovasculares, isso
denota a importância de explicar ao paciente corre-
tamente a etiologia de sua dor, buscando inteirar o
paciente com a sua condição clínica real, eliminando
receios desnecessários, facilitando então a adesão ao
tratamento.
(27)
Acredita-se que a depressão e a ansiedade facilitem
as aferências dolorosas quando atuam em níveis centrais,
participando desta forma da patogênese da dor.
A prevalência de transtornos ansiosos é aumentada
em pacientes migranosos ao longo da vida quando estes
Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013 29
são comparados a sujeitos controles. Foram observadas
as seguintes proporções: transtorno de pânico (10,9%
vs. 1,8%), transtorno de ansiedade generalizada (10,2%
vs. 1,9%), transtorno obsessivo compulsivo (8,6% vs. 1,8%)
e transtornos fóbicos (39,8% vs. 20,6%). Foi constatado
em um dos estudos sobre comorbidades em cefaleia que
pacientes migranosos com aura tinham a prevalência mais
aumentada a vários transtornos de ansiedade enquanto
que pacientes migranosos sem aura, possuíam maior
prevalência em transtorno de pânico e transtornos
fóbicos.
(29-31
O mesmo autor percebeu em suas amostras longi-
tudinais que a ansiedade precedia a idade de início da
migrânea e esta era seguida pela depressão, com isto,
sugeriu uma relação sindrômica entre essas patologias,
iniciando com a ansiedade, seguida da migrânea e
posteriormente episódios depressivos.
(29,30)
Esses achados nos levam a repensar a migrânea e
seu impacto na qualidade de vida dos sujeitos acome-
tidos, ressaltando a importância da compreensão dessas
patologias como entidades clínicas diferenciadas, porém
podem aparecer num mesmo paciente simultaneamente
ou separadamente ao longo de sua vida. O conhe-
cimento dos sintomas auxiliaria a médico na prescrição
do tratamento adequado e individualizado com a fina-
lidade de obter a remissão ou controle dos sintomas
evitando recidivas, oferecendo portanto melhor qualidade
de vida. Desconhecer essas e outras comorbidades
poderia indicar insucesso no tratamento.
(32)
TRATAMENTOS
As crises apresentadas pelos pacientes podem ser
incapacitantes, impedindo-os muitas vezes de realizarem
suas atividades cotidianas, devido à dor e o desconforto
sentidos, sobretudo quando a cefaleia apresenta comor-
bidades, muitas vezes favorecidas pelas dificuldades nas
relações laborais, pessoais e sociais apresentadas por
esses pacientes. É importante o conhecimento do médico
sobre as patologias para que então possa ajudar o
paciente em suas dificuldade e limitações. Sabe-se que
as crises migranosas associadas ou não a comorbidades
psiquiátricas podem ser desencadeadas por fatores
internos e externos, por isto faz-se necessário o
conhecimento da fisiopatologia da mesma.
O tratamento a ser implantado deverá ser funda-
mentado na história clínica do paciente, levando em
consideração as comorbidades e efeitos indesejáveis que
possam surgir.
Em pacientes que apresentam depressão e migrâ-
nea, se não houver a possibilidade de tratar simulta-
neamente as duas patologias, é interessante priorizar a
que cause mais sofrimento ao paciente. Alguns estudos
referem que antidepressivos tricíclicos podem ser eficientes
na profilaxia da migrânea em pequenas doses. Embora
seja útil no controle dos sintomas ansiosos, para o controle
da depressão é necessário doses mais altas, o que
poderia acarretar alguns sintomas indesejáveis. Os inibi-
dores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) por
sua vez, auxiliariam no bem-estar do paciente, entretanto,
estudos sobre os ISRS na profilaxia da migrânea ainda
são poucos.
(33)
Atualmente, muitos médicos vêm receitando o uso
do topiramato, obtendo ótimos resultados, porém poucos
estudos descrevem melhora no controle da depressão.
Fármacos como a lamotrigina e carbonato de lítio,
também se mostraram muito eficientes na estabilização
do humor e no controle das crises migranosas, assim como
o valproato de sódio.
(34)
Os betabloqueadores por sua vez, são contra-
indicados em pacientes com história de depressão, por
induzirem sintomatologia depressiva.
Levando em consideração que dependendo do
histórico clínico do paciente algumas vezes a
politerapia é contraindicada, é importante optar por
medicamentos que ofereçam boa relação entre
eficácia terapêutica e efeitos colaterais, esclarecendo
ao paciente sobre os possíveis efeitos indesejáveis que
possam surgir, evitando assim o abandono do
tratamento pelo paciente.
O tratamento não medicamentoso baseia-se na
reeducação do paciente, no esclarecimento da doença,
como sendo fundamentalmente biológica e muitas vezes
hereditária, informando a importância de evitar fatores
desencadeantes e/ou agravantes como por exemplo
alimentação e hábitos de vida em alguns casos,
facilitando e motivando então a adesão ao tratamento
por parte do paciente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A hipótese de que a fisiopatologia das cefaleias
poderia contribuir para o surgimento e evolução de
sintomatologia depressiva e ansiosa, bem como as
limitações e dificuldades apresentadas pelos pacientes
devidos as dores e impacto na vida cotidiana, foram
confirmadas através do levantamento de vários autores
apresentados.
COMORBIDADES PSIQUIÁTRICAS EM PACIENTES DE CEFALEIAS PRIMÁRIAS
30 Headache Medicine, v.4, n.1, p.25-30, Jan./Feb./Mar. 2013
Correspondence
Camila Cordeiro dos SantosCamila Cordeiro dos Santos
Camila Cordeiro dos SantosCamila Cordeiro dos Santos
Camila Cordeiro dos Santos
Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária
50670-901 – Recife, PE
Fone PABX: (81) 2126.8000
camilachristielly@hotmail.com
O presente estudo teve como pretensão oferecer
informações baseadas em recentes estudos publicados
na área de cefaleias e comorbidades psiquiátricas,
ressaltando a importância do conhecimento do
profissional de saúde sobre o tema, favorecendo sua
prática e eficiência no tratamento, além da adesão do
paciente, auxiliando então, a promoção da sua
qualidade de vida.
REFERÊNCIAS
1. Lipton RB, Hamelsky SW, Kolodner KB, Steiner TJ, Stewart WF.
Migraine, quality of life and depression. A population- based
case control study. Neurology. 2000; 55(5):629-35.
2. Lipton RB, Silberstein MD, Stewart WF. An update on the
epidemiology of migraine. Headache. 1994; 34: 319-328.
3. Fauci, AS. et al. Harrison. Medicina Interna. 17ª. ed. Rio de
Janeiro: Mc Graw Hill, 2008.
4. Headache Classification Committee of the International Headache
Society. The International Classification of Headache Disorders,
2nd Edition. Cephalalgia. 2004; 24 (Suppl. 1): 1-152.63
5. Costa, EAC. Comorbidades psiquiátricas na migrânea com e
sem abuso de medicações analgésicas [Dissertação] , 2007.
6. Goldman, Lee. Cecil Tratado de Medicina Interna. 23ª Ed.
Elsevier, 2009.
7. Kessler R, et al. The epidemiology of psychiatric comorbidity.
Texbook os psychiatric epidemiology. New York: John Wiley &
Sons; 1995. p. 179-98.
8. Moschiano F, et al. Neurobiolog of chronic migraine. Neurol
Sci. 2003; Suppl 2:S 94-6
9. Juang KD, Wang SJ, Fuh JL, Lu SR, Su TP. Comorbidity of depressive
and anxiety disorders in chronic daily headache and its subtypes.
Headache 2000;40:818-23.
10. Radat F, Swendsen J. Psychiatric Comorbidity in migraine: a
review. Cephalalgia. 2004; 25:165-178
11. Mitsikostas DD. Comorbity of headache and depressive
disorders. Cephalalgia. 1999;19:211-217.
12. Carvalho J. Enxaqueca e comorbidades. Por que estuda-las?
2004; 2(Supl 1 ): 23-26
13. Ressler KJ, Nemeroff CB. Role of serotoninergic and
noradrenergic systems in the pathophysiology o depression and
anxiety disorders. Depression and Anxiety 2000; 12(suppl I):
S2-S19.
14. Wolff HG. Personality features and reactions of subjects with
migraine. Arch Neurol Psychiat. 1937; 37:895.
15. Merikangas KR. Psychopathology and headache syndromes in
the community. Headache. 1994; 34:S17-S26
16. Breslau N, Davis GC, Schultz LR, Peterson EL. Migraine and
major depression. Headache. 1994; 34:387-93.
17. Breslau N, Schultz LR, Stewart WF, Lipton RB, Lucia VC, Welch
KMA. Headache and major depression. Is the association specific
to migraine? Neurology. 2000; 54:308-13.
18. Breslau N, Davis GC, Andreski P. Migraine, psychiatric disorders,
and suicide attempts: an epidemiologic study of young adults.
Psychiatry Res. 1991;37:11-23.
19. Breslau N, Davis GC. Migraine, physical health and psychiatric
disorder: a prospective epidemiologic study in young adults. J
Psychiatr Res. 1993; 27:211-21.
20. Arruda, M.A., Guidetti, V.(eds) 2007. Cefaleias na Infância e
Adolescência, 1ª ed., Instituto Glia SP, Ribeirão Preto. Wainer.
21. Mercante JPP, Peres MFP, Guendler V, Zukerman E, Bernik MA.
Depression in Chronic: Severity and clinical features Arq
Neuropsiquiatr. 2005;63(2A):217-220.
22. Galego JCB, Cipullo JP, Cordeiro JA, Tognola WA. Depression
and Migraine. Arq. Neuro-Psiquiatr. 2004; 62:774-777
23. Wainer, R., Pergher, G.K. & Piccoloto, N.M. Terapia cognitivo
comportamental das depressões. In Caminha (Org).
Psicoterapias cognitivos comportamentais: Teoria e prática. Casa
do Psicólogo: São Paulo, 2003.
24. Ballone G.J. Depressão. PsiqWeb, Internet, disponível em
www.psiqweb.med.br, revisto em 2007. Acesso em 11/02/
2012.
25. Kowacs P, Kowacs F. Depressão e Migrânea. Einstein, 2004;
2(Supl 1 ): 40-44.
26. Choi YC, Kim WJ, Kim CH, Lee MS. A clinical study of chronic
headaches: clinical characteristics and depressive trends in
migraine and tension-type headache.Yonsei Med J
1995;36:508-514.
27. Matta, APC and MOREIRA FILHO, PF. Sintomas depressivos e
ansiedade em pacientes com cefaléia do tipo tensional crônica
e episódica. Arq. Neuro-Psiquiatr]. 2003;.61(4): 991-4.
28. Kaplan HI et al. Compêndio de Psiquiatria. Ciências do
Comportamento e Psiquiatria Clínica. Porto Alegre: Artmed, 2006
29. Merikangas KR, Angst J, Isler H. Migraine and psychopathology:
Results of the Zurich Cohort Study of Young Adults. Arch Gen
Psychiatry 1990; 47: 849-53.
30. Merikangas KR, Merikangas JR, Angst J. Headache syndromes
and psychiatric disorders: Association and familial transmission.
J Psychiatr Res 1993; 27:197-210.
31. Mercante J, Bernik M. Cefaleias primárias e transtornos de
ansiedade. 2004; 2(Supl 1 ): 45-48.
32. Devlen J. Anxiety and depression in migraine. J Roy Soc Med
1994; 87:338-41. 65.
33. Sociedade Brasileira de Cefaleia. Recomendações para o tratamento
profilático da migrânea:Consenso da Sociedade Brasileira de
Cefaléia. Arq. Neuro-Psiquiatr. 2002;.60(1):159-69.
34. Kowacs F. Avaliação dos sintomas de ansiedade e de transtorno
mental inespecífico em pacientes portadores de migrânea
[Dissertação]. Rio Grande do Sul. Universidade do Rio Grande
do Sul. 1999.
SANTOS CC, LIPPI GR