Headache Medicine, v.3, n.4, p.198-235, Oct./Nov./Dec. 2012 204
Qualidade de vida e incapacidade relacionada
à saúde de crianças com migrânea
Gabriela Natália Ferracini
1
, Fabíola Dach
2
, José Geraldo Speciali
3
1
Fisioterapeuta, doutoranda em Neurociências da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil
2
Doutora em Neurologia, Médica assistente do Ambulatório de Cefaleia do Hospital das Clínicas de
Ribeirão Preto (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil
3
Professor associado de Neurologia do Departamento de Neurociências e Ciências do
Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil
Ferracini
GN, Dach
F, Speciali JG. Qualidade de vida e incapacidade relacionada à
saúde de crianças com migrânea. Headache Medicine. 2012;3(4):203-5
RESUMORESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
A migrânea leva a uma redução da participação de crianças
nas atividades de casa e de lazer e no rendimento escolar,
além de comprometer os aspectos psicológicos, gerando
um impacto negativo na qualidade de vida relacionada à
saúde. Este estudo objetivou avaliar a incapacidade que
esta condição causa na vida diária de crianças de 6 a 12
anos de idade de ambos os gêneros e se influencia a
qualidade de vida. A amostra foi composta por 50 crianças
com migrânea sem aura e 50 crianças sem histórico de
cefaleia. Para verificar a incapacidade aplicou-se o
questionário Pediatric Migraine Disability Score e para
qualidade de vida o questionário Pediatric Quality of Life
Inventory4.0
TM
. Os meninos perderam em média 13 (DP
26,36) dias e as meninas em média 15 (DP 22,43) dias
sobre atividade e rendimento escolar, tarefas de casa e lazer,
em três meses. De acordo com o grau de incapacidade, 19
(38%) apresentaram pouca ou ausência de incapacidade
(Grau I), 17 (34%) leve (Grau II), sete (14%) moderada
(Grau III) e sete (14%) incapacidade grave (Grau IV) sobre
atividade e rendimento escolar, tarefas de casa e lazer. A
qualidade de vida, pela percepção dos pais, é pior nas
crianças com migrânea [IC95% (-16,92 – -6,18) p<0,01],
mas na percepção das crianças é semelhante nos dois
grupos. Quando se analisam separadamente os vários
domínios do questionário, pela percepção dos pais, há
diferenças nos domínios físico [IC95% (-15,24 – -1,88)
p<0,01] e psicossocial [IC95% (-17,96 – -6,74) p<0,01].
Enquanto que pela autoavaliação das crianças, houve
diferença nos domínios emocional [IC95% (-16,95 – -5,70)
p<0,01] e escolar [IC95% (-15,90 – -5,74) p<0,01]. Não
foi encontrada correlação entre os dias perdidos devido à
migrânea e a qualidade de vida.
PP
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P
alavrasalavras
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--
--
-
chave:chave:
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chave: Cefaleia; Crianças; Qualidade de vida
INTRODUÇÃO
Cefaleia é a causa mais comum de dor na infância,
com alto risco para tornar-se crônica e persistente na
idade adulta.
(1)
A incapacidade que a migrânea causa
durante e entre as crises leva a uma redução da parti-
cipação da criança nas atividades familiar, social e
SHORT COMMUNICATIONS
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escolar, além do comprometimento dos aspectos
psicológicos, gerando um impacto negativo na qualidade
de vida.
(2)
A Qualidade de Vida relacionada à saúde (QVRS)
compreende os efeitos que as doenças e os tratamentos
têm sobre a vida diária e a satisfação pessoal.
(3)
O
impacto sobre a QVRS pode ser avaliado por meio de
instrumentos multidimensionais, que mensuram a per-
cepção subjetiva e individual (autorrelato) nos aspectos
físico, emocional, psicológico e social.
(3)
Um instrumento
genérico, utilizado para a população pediátrica e com
validação para a população brasileira
(4)
é o Pediatric
Quality of Life Inventory (PedsQL™ 4.0),
(5)
que analisa a
percepção da criança e de seus pais perante a do-
ença. Além disso, há um instrumento mais específico
para se mensurar a incapacidade que a migrânea causa
na vida de crianças denominado Pediatric Migraine
Disability Score (PedMIDAS),
(6)
desenvolvido por meio
da versão utilizada em adultos, o Migraine Disability
Assessement Score.
(7)
OBJETIVO
Avaliar a incapacidade que a migrânea causa na
vida diária de crianças de 6 a 12 anos de idade de
ambos os gêneros e se ela influencia a qualidade de
vida.
METODOLOGIA
A amostra foi composta por 100 crianças (68
meninas e 32 meninos) de 6 a 12 anos de idade (média
9,9 anos, DP 1,6), divididas em dois grupos: grupo de
estudo composto por crianças com diagnóstico de migrâ-
nea sem aura de acordo com a segunda edição da
Classificação Internacional de Cefaleias,
(8)
do ambu-
latório de Cefaleia e Algias Craniofaciais da Infância do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto; grupo controle composto por crianças sem
histórico de cefaleia há pelo menos seis meses, sele-
cionadas do Ambulatório de Problemas de Crescimento
e Desenvolvimento. Foram excluídas as crianças que
apresentassem doenças musculares, dermatológicas,
neurológicas graves e inflamatórias crônicas, as que não
compreendessem o que era explicitado ou as que não
concordassem em participar do estudo. O consenti-
mento foi dado pelos pais ou responsáveis, com assina-
tura de um termo de consentimento livre e esclarecido.
Para verificar a incapacidade, foi aplicado o questio-
nário Pediatric Migraine Disability Score
(6)
e, para
qualidade de vida, o questionário Pediatric Quality of
Life Inventory 4.0
TM
.
(5)
RESULTADOS
Os meninos perderam em média 13 (DP 26,36) dias
e as meninas em média 15 dias (DP 22,43) sobre ativi-
dade e rendimento escolar, tarefas de casa e lazer, em
três meses, não havendo diferença significativa entre os
gêneros [IC95% (-14,02 - 16,67); p=0,86].
De acordo com o grau de incapacidade, 19 (38%)
crianças apresentaram pouca ou ausência de incapa-
cidade (Grau I), 17 (34%) incapacidade leve (Grau II),
sete (14%) moderada (Grau III) e sete (14%) incapacidade
grave (Grau IV) sobre atividade e rendimento escolar,
tarefas de casa e lazer. Na análise em separado de
meninos e meninas, 40% das meninas apresentaram
pouca ou ausência de incapacidade (Grau I), 29%
incapacidade leve (Grau II), 17% moderada (Grau III) e
14% grave (Grau IV). Os meninos apresentaram 32%
pouca ou ausência de incapacidade (Grau I), 50% leve
(Grau II), 12% moderada (Grau III) e 6% grave (Grau IV)
(Figura 1).
A qualidade de vida, pela percepção dos pais, é
pior nas crianças com migrânea [IC95% (-16,92 – -6,18)
p<0,01], mas na percepção das crianças a qualidade
de vida é semelhante nos dois grupos. Quando se
analisa separadamente os domínios do questionário, pela
percepção dos pais, há diferenças nos domínios físico
[IC95% (-15,24 – -1,88), p<0,01] e psicossocial [IC95%
(-17,96 – -6,74), p<0,01]. Enquanto que pela auto-
avaliação das crianças, houve diferença nos domínios
emocional [IC95% (-16,95 – -5,70) p<0,01] e escolar
[IC95% (-15,90 – -5,74) p<0,01] (Tabela 1).
SHORT COMMUNICATIONS
Figura 1 – Graus de incapacidade do PedMIDAS entre os gêneros do
Grupo estudo.
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Não foi encontrada correlação entre os dias perdidos
devido à cefaleia e a qualidade de vida.
CONCLUSÃO
O grau de incapacidade foi em geral ausente ou
leve em 72% das crianças, e apenas 14% apresentaram
o grau de incapacidade grave.
A qualidade de vida não se apresentou pior em
crianças com migrânea, pela percepção das crianças,
mas pela percepção dos pais, a qualidade de vida
relacionada á saúde é pior em crianças com migrânea.
A incapacidade que a migrânea causa nas ativi-
dades diárias não parece interferir na qualidade de vida.
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Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo - HCFMRP/USP, sob protocolo
3694/2010.
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