200 Headache Medicine, v.3, n.4, p.198-235, Oct./Nov./Dec. 2012
SHORT COMMUNICATIONS
Avaliação do equilíbrio, agilidade e presença
de tontura em pacientes com migrânea com e
sem aura
Carvalho GF, Gonçalves MC, Florêncio LL, Dach F, Ferreira KS, Chaves TC, Speciali JG, Bevilaqua-Grossi D
Faculdade de Medicina de Ribeirão preto, Universidade de São Paulo – USP
Carvalho GF, Gonçalves MC, Florêncio LL, Dach F, Ferreira KS, Chaves TC, Speciali JG, Bevilaqua-Grossi D.
Avaliação do equilíbrio, agilidade e presença de tontura em pacientes com migrânea com e sem aura
Headache Medicine. 2012;3(4):200-3
INTRODUÇÃO
A migrânea pode estar associada ao acidente
vascular cerebral e a complicações isquêmicas
devido à depressão da atividade elétrica e conse-
quente diminuição do fluxo sanguíneo cerebral.
(1,2)
A substância branca cerebral é afetada, especial-
mente nas regiões do cerebelo, tronco encefálico
e o ouvido interno, podendo favorecer o apareci-
mento de sinais e sintomas como vertigem, dese-
quilíbrio, aumento da oscilação postural, incoor-
denação dos movimentos, dismetria e/ou disfa-
gia, além de prejuízos na força e ritmo da con-
tração muscular.
(3)
Segundo Etminan (2005) essas
alterações são maiores quando há a presença
de aura.
(1)
OBJETIVO
Avaliar a oscilação do centro de pressão
(COP), a agilidade, o relato e impacto da tontura
em pacientes com migrânea com aura (MA) e sem
aura (M) e indivíduos controle (GC).
MÉTODOS
Os pacientes, todos do gênero feminino e
idade entre 18 e 55 anos, foram triados do am-
bulatório de cefaleia de um hospital terciário e
diagnosticadas com migrânea com aura ou sem
aura por neurologistas especialistas em cefaleia
de acordo com a ICHD-II (2004). Foram excluídos
pacientes obesos, com relato de vestibulopatias,
doenças sistêmicas, outros tipos de cefaleia ou em
uso de medicamentos que afetem o equilíbrio. O
grupo controle foi composto de funcionários e acom-
panhantes, pareados pela idade.
Foram avaliadas 92 voluntárias, sendo 31 do grupo
M, 31 do grupo MA e 30 do GC. A amostra foi homo-
gênea, exceto pelo índice de massa corporal (IMC), maior
no grupo MA em relação ao GC (Tabela 1).
O COP foi mensurado através da estabilometria com
uma plataforma de força (AMTI - OR6-7-1000) em apoio
bipodal e unipodal, com olhos abertos e fechados du-
rante trinta segundos. A coleta foi aleatorizada por sorteio.
A agilidade foi avaliada pelo teste Timed Up and
Go (TUG), no qual o paciente é orientado a se levantar
de uma cadeira, andar três metros e retornar a sentar em
um menor tempo possível.
A tontura foi avaliada pelo questionário Dizziness
Handicap Inventory (DHI), que considera os aspectos
psicológicos, físicos e funcionais relacionados a este
sintoma.
Para análise entre os grupos, foi utilizado um modelo
de regressão linear com efeitos mistos para a plataforma
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de força e teste TUG e um modelo de regressão logística
para o DHI, com nível de significância de α<0,05.
O estudo foi aprovado pelo comitê de ética local
(processo n° 4126/2010).
RESULTADOS
Os resultados revelaram maior oscilação do COP no
grupo MA em relação ao grupo M e GC em apoio bipodal
com olhos abertos e fechados (p<0,02). Pacientes com
MA apresentaram maior deslocamento do COP em rela-
ção ao grupo M nas situações unipodal com olhos abertos
(p<0,02) (Figura 1). Os pacientes com migrânea não
conseguiram executar a coleta em apoio unipodal com
os olhos fechados, sendo este dado dispensado da análise.
Os dados de controle dos pacientes, inclusive o IMC, não
exerceram influência nos dados da plataforma de força,
teste TUG e relato de tontura.
Não houve diferença no tempo de realização do
TUG (segundos) entre os grupos MA (8,5 segundos) e
M (8,2 segundos), porém ambos os grupos foram dife-
rentes do GC (6,5 segundos; p<0,01) (Figura 2). Além
da presença da migrânea, o aumento da idade se mos-
trou relacionado com a diminuição da mobilidade.
Sintomas de tontura foram verificados em 80% do
grupo MA e 65% do grupo M, apresentando um risco
de 58 vezes no grupo MA e de 25 vezes no grupo M
para o desenvolvimento deste sintoma em relação a indi-
víduos sem a patologia. A tontura exerceu influência signi-
ficante nas atividades de vida diária destes pacientes,
com impacto moderado segundo os escores do questio-
nário (p<0,001) (Tabela 2).
Figura 1 – Log. da média e intervalo de confiança das áreas de oscilação corporal (cm
2
) em apoio bipodal com olhos abertos (OA), olhos
fechados (OF), Apoio unipodal direito (DOA) e esquerdo (EOA) com olhos abertos do Grupo Controle (GC), Grupo Migrânea sem Aura (M) e
Grupo Migrânea com Aura (MA).**Transformação da variável em Logaritmo. *p=0,001;
p=0,02.
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Figura 2 – Log. da média e intervalo de confiança das áreas do
tempo de execução do teste Timed Up and Go (TUG).
* p<0,001;
p<0,01.
em atividades diárias onde haja diminuição da lumi-
nosidade, por exemplo.
Nossos resultados também apontaram para a
influência da idade e da migrânea sobre os resultados
do teste TUG. É possível inferir que idosos com história
de migrânea apresentem um aumento particular do
risco de quedas quando comparado a idosos sem
migrânea.
Além da idade, a cronicidade parece ser um fator
agravante para o desequilíbrio.
(5)
Em pacientes com
migrânea crônica foram detectadas disfunções subclínicas
nos sistemas vestibular e cerebelar, além de alterações
da motricidade ocular, sugerindo que a maior oscilação
tenha causa central.
(5,6)
Esses achados são coerentes com
estudos de imagem que relacionam o aumento da fre-
quência de crises com a maior incidência de lesões corti-
cais, encontradas especialmente no cerebelo de migra-
nosos com aura.
(1,2)
É possível que em uma amostra com-
posta de pacientes com migrânea crônica fosse possível
verificar um maior espectro de diferença em relação ao
grupo controle.
Apesar de estar bem estabelecida a associação entre
as patologias vestibulares e relato de vertigem/tontura
em pacientes com migrânea,
(7)
pouco se sabe sobre o
impacto dessas condições nesse grupo de pacientes.
Os dados revelaram que houve um impacto mode-
rado da tontura nos aspectos físicos, funcionais e psico-
lógicos nos pacientes com migrânea, independente da
presença de aura. Escores semelhantes do DHI foram
encontrados em outros estudos. A melhora dos escores
do DHI com a reabilitação vestibular
(8)
sugere que estes
pacientes precisem ser orientados quanto ao risco de
quedas em atividades funcionais, especialmente durante
a crise.
CONCLUSÕES
Nossos dados demonstraram que pacientes com
migrânea (com e sem aura) apresentam alterações no
equilíbrio estático, na agilidade e mobilidade, além da
alta prevalência de tontura, com impacto em vários
aspectos da vida diária. A aura parece influenciar de
forma significativa a estabilidade postural destes paci-
entes.
REFERÊNCIAS
1. Etminan M, Takkouche B, Isorna FC, Samii A. Risk of ischaemic
stroke in people with migraine: systematic review and meta-
analysis of observational studies. BMJ. 2005;330:63.
DISCUSSÃO
Nossos resultados mostraram que houve maior
oscilação em pacientes com migrânea em nas situações
OA e OF, contudo, houve uma diferença maior entre os
grupos quando o teste foi realizado com os olhos
fechados. Outros estudos já sugeriram uma tendência
de deslocamento maior em migranosos e piores resul-
tados nos testes com olhos abertos
(4)
ou com olhos
fechados.
(3)
É importante salientar que os indivíduos com migrâ-
nea com aura apresentaram prejuízo quanto à oscilação
postural nas posições de apoio bipodal e unipodal com
olhos abertos, todavia, foram capazes de realizar a
função. Já com apoio unipodal e olhos fechados, espe-
cialmente com o membro não dominante, ambos os
grupos com migrânea apresentaram uma limitação
funcional para esta tarefa. Este dado sugere maior risco
de quedas em situações que exijam tal função, como
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