Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012 13
Influência do tempo de menopausa na qualidade
de vida e sua relação com a migrânea
Influence of time of menopause in quality of life and its relation
to migraine
RESUMORESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
O tempo decorrido após a menopausa influencia os sintomas
do hipoestrogenismo experimentados pelas mulheres, e as
características dos ataques de migrânea naquelas acometidas
pela doença. Esta revisão buscou evidências científicas alu-
sivas à relação entre qualidade de vida (QV) e as fases da
pós-menopausa e à influência das oscilações hormonais do
climatério nas mulheres com migrânea. Foram pesquisados
os termos quality of life, menopause, perimenopause, early
menopause, late menoapause, climacteric symptoms,
hormonal, estrogens, migraine, pathophysiology nas bases
MEDLINE (PubMed) e SciELO Brasil. Tornou-se clara a relação
dos estrogênios com a fisiopatogenia da migrânea e esta
pode ser a chave para explicar possíveis diferenças na QV
entre as fases da pós-menopausa. Não existem estudos
observacionais para avaliar possíveis diferenças na QV entre
as fases da pós-menopausa e averiguar o papel da migrânea
com as eventuais diferenças encontradas.
PP
PP
P
alavrasalavras
alavrasalavras
alavras
--
--
-
chave:chave:
chave:chave:
chave: Qualidade de vida; Menopausa; Clima-
tério; Estrogênios; Migrânea; Pós-menopausa recente; Pós-
menopausa tardia
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT
The time since menopause influences the hypoestrogenism
symptoms experienced by women and characteristics of
migraine attacks in those with the disease. This review aimed
to scientific evidence alluding to the relationship between quality
of life (QOL) and the phases of post-menopause and the
VIEW AND REVIEWVIEW AND REVIEW
VIEW AND REVIEWVIEW AND REVIEW
VIEW AND REVIEW
Sidraiton Sálvio Alves de Melo Filho
1
, Marcelo Moraes Valença
2
1
Ginecologista, Mestrando em Neurociências pela Pós-graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do
Comportamento do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, Recife, PE, Brasil
2
Livre-Docente em Neurocirurgia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo – FMRP-USP; Professor Associado de Neurologia e Neurocirurgia,
Departamento de Neuropsiquiatria da UFPE; Coordenador da Pós-Graduação em Neuropsiquiatria, UFPE
Melo Filho SS, Valença MM
Influência do tempo de menopausa na qualidade de vida e sua relação com a migrânea.
Headache Medicine. 2012;3(1):13-20
influence of hormonal fluctuations of menopause in women
with migraine. The terms quality of life, menopause,
perimenopause, early menopause, late menopause, climacteric
symptoms, hormones, estrogens, migraine, pathophysiology
have been searched in MEDLINE (PubMed) and SciELO Brasil.
It became clear the relationship of estrogens to the
pathophysiology of migraine and this may be the key to explain
possible differences in QOL between the phases of post-
menopause. Lack of observational studies to evaluate possible
differences in QOL between the phases of post-menopause
and examine the role of migraine with any differences.
Keywords: Keywords:
Keywords: Keywords:
Keywords: Quality of life; Menopause; Estrogens; Migraine;
Early menopause; Late menopause
INTRODUÇÃO
A pós-menopausa é dividida em recente (os primei-
ros cinco anos de menopausa) e tardia (os dez anos
seguintes). Na perimenopausa e pós-menopausa recente,
prevalecem os sintomas vasomotores (fogachos, sudorese
fria), tendência ao humor depressivo e piora da inten-
sidade e na frequência das crises em pacientes com
migrânea. Na pós-menopausa tardia prevalecem sinto-
mas físicos (fadiga, dores osteoarticulares, etc.) e ligados
à atrofia tecidual (urogenital, da pele e das mamas, entre
14 Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012
MELO FILHO SS, VALENÇA MM
outros). Relatos na literatura sugerem a relação entre
qualidade de vida (QV) e tempo de menopausa.
(1-3)
Vários estudos demostraram o impacto da migrânea na
qualidade de vida, levando a Organização Mundial de
Saúde (OMS) a colocar essa doença na posição de
número 19 na lista de doenças mais incapacitantes em
todo o mundo.
(4)
Faz-se então necessário conhecermos
de que forma a QV se altera no decorrer das fases da
menopausa e o papel da migrânea nesta alteração.
MÉTODOS
O presente estudo é uma revisão de literatura. A
metodologia consistiu na procura de evidências científicas
alusivas à relação entre QV e as etapas da pós-meno-
pausa, bem como à influência das oscilações hormonais
do climatério nas mulheres com migrânea. Para tal, efe-
tuou-se pesquisas nas bases de dados eletrônicas MEDLINE
(PubMed) e SciELO Brasil, ligadas ao Portal CAPES.
Utilizaram-se os seguintes termos para pesquisa: quality
of life, menopause, perimenopause, early menopause, late
menopause, climacteric symptoms, hormonal, estrogens,
migraine, pathophysiology. Os referidos termos foram
pesquisados isolados ou associados. Atendendo à finali-
dade de revisão da literatura científica existente, não se
delimitou qualquer período para a publicação de artigos.
Excluíram-se aqueles que não se apresentavam nas lín-
guas inglesa ou portuguesa. Para cada citação relevante,
a bibliografia foi revista a fim de identificar fontes adicio-
nais de dados pertinentes.
ClimatérioClimatério
ClimatérioClimatério
Climatério
Climatério é o período de vida da mulher compre-
endido entre o fim da fase reprodutiva e o início da seni-
lidade ou senectude. O termo climatério é originado do
grego klimacton, que significa crise ou período crítico. A
idéia de "crise" que se tinha na Grécia antiga pode se
justificar pelas intensas mudanças que se observam em
todo o corpo feminino, neste período da vida, conse-
quentes à queda da produção de estrogênios pelos ová-
rios. Há atrofia progressiva da pele e seus anexos e tam-
bém dos órgãos genitais, urinários e das mamas. Altera-
ções do metabolismo dos lipídeos e dos ossos são uma
regra, havendo maior tendência à obesidade, à fadiga
e ao aumento da incidência de doenças cardiovasculares
e osteoporose. Diminuição da acuidade visual (pres-
biopia) também é observada.
(5)
No sistema nervoso
central (SNC) há alterações sobre os centros termor-
reguladores hipotalâmicos e, como consequência, se
tornam comuns sintomas vasomotores, como ondas de
calor e sudorese. Nos últimos anos, também se tem rela-
cionado o hipoestrogenismo a modificações neuroló-
gicas, entre elas à doença de Alzheimer.
(6-8)
Outros efei-
tos dos estrogênios sobre o SNC justificam a relação
destes hormônios com migrânea.
(9)
A diminuição dos níveis estrogênicos é progressiva e
quando estes não apresentam concentrações suficientes
para desencadear a liberação do pico pré-ovulatório do
hormônio luteinizante, surgem os ciclos anovulatórios e ir-
regularidades menstruais, de modo que as menstruações
ficam mais espaçadas. Quando a mulher climatérica com-
pleta doze meses de amenorreia, diz-se que a mesma
atingiu a menopausa, que é o advento da última mens-
truação. Segundo a Sociedade Brasileira de Climatério
(SOBRAC), podemos dividir o climatério em três fases:
(10)
Pré-menopausa: vai do final da vida reprodutiva
até o momento da menopausa
Perimenopausa: abrange o duplo período de dois
anos, que precede e sucede a menopausa
Pós-menopausa: inicia-se na menopausa e finda
na senectude. Esta, por sua vez, se divide em:
– Pós-menopausa recente: são os primeiros cin-
co anos após a menopausa.
– Pós-menopausa tardia: são os dez anos se-
guintes ao término da pós-menopausa recente.
Com o fim da menopausa tardia, isto é, após quinze
anos do advento da última menstruação, segundo a
SOBRAC, a mulher entra numa outra etapa da vida
chamada de senectude ou senilidade.
A síndrome do climatério, moléstia menopausal ou
síndrome menopausal compreende conjunto de sintomas
e sinais que aparecem no climatério, prejudicando o bem-
estar da mulher.
Qualidade de vida no climatérioQualidade de vida no climatério
Qualidade de vida no climatérioQualidade de vida no climatério
Qualidade de vida no climatério
Para a OMS, QV é a percepção que uma pessoa
tem de sua posição na vida, no contexto do sistema de
valores e da cultura a que está inserida, em relação às
suas metas, expectativas, padrões e crenças.
(11)
Perce-
be-se que QV tem um conceito amplo e multidimensional,
visto que não só envolve os aspectos relacionados à saú-
de física e mental do indivíduo, mas também aspectos
outros, de cunho emocional, econômico, social, cultural
e espiritual. O conceito de QV é também subjetivo, ao
passo em que busca captar qual o ponto-de-vista do
indivíduo a respeito de sua própria vida. Em sendo um
parâmetro subjetivo por definição, o questionamento di-
reto é o modo mais simples e apropriado para se obterem
Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012 15
informações a respeito dos sintomas e sensações dos indi-
víduos em questão.
(12)
Foi com o objetivo de transformar
conceitos individuais em dados objetivos e mensuráveis,
passíveis de serem quantificados, analisados e compara-
dos entre populações diferentes, que foram criados diver-
sos questionários de QV. Tais instrumentos possibilitaram a
médicos e a pesquisadores transformar informações sub-
jetivas em medidas quantitativas para que possam ser usa-
das em ensaios clínicos e em estudos econômicos.
(13-15)
Cada vez mais, na área de saúde, a QV tem sido
avaliada para mensurar o impacto dos agravos à saúde
no bem-estar das pessoas. Com os avanços tecnológicos
em métodos diagnósticos e tratamentos de doenças,
houve um aumento da expectativa de vida das pessoas,
(16)
mas esse fato não determina que elas tenham uma melhor
QV. Pelos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, a esperança de vida ao nascer da brasileira
no ano de 2010 foi de 77 anos.
(16)
Por outro lado, a
idade da menopausa vem se mantendo constante ao
longo do tempo. Se houve mudança, contudo, a história
indica que foi mínima.
(17,18)
Sendo assim, a brasileira
passa boa parte de sua vida (aproximadamente um terço
dela) em situação de hipoestrogenismo, convivendo com
os sintomas dele decorrentes.
A avaliação do impacto de uma condição sobre a
QV é particularmente relevante em situações sintomáticas,
como o climatério.
(19,20)
Há dados que sugerem uma
queda na QV no climatério, tanto na transição meno-
pausal (perimenopausa), quanto nos anos que sucedem
o advento da última menstruação. Os aspectos físicos
da saúde geral e do bem-estar emocional declinam
durante a transição da menopausa.
(21,22)
Os sintomas
climatéricos acometem entre 60% a 80% das mulheres e
são reconhecidos como indutores de desconforto físico e
emocional que aumentam com a gravidade dos sinto-
mas.
(19,23)
A depender da intensidade e da frequência
dos sintomas, em especial as ondas de calor, pode haver
interferência no bem-estar e na QV.
(24)
Entre os vários questionários de QV utilizados em
saúde está o Questionário de Saúde da Mulher (QSM),
um dos principais instrumentos de avaliação da QV da
mulher climatérica, pesquisando especificamente os pro-
blemas relacionados a esta fase da vida.
(25)
Desenvolvido
por Hunter em 1992, para mensurar o relato subjetivo
do bem-estar físico e mental de mulheres entre 45 e 65
anos, o QSM foi traduzido e validado para o português
do Brasil por Silva-Filho.
(26)
Seus ítens foram escolhidos com o cuidado de não
enfatizarem os sintomas negativos, sendo inclusive cha-
mado de Questionário de Saúde (Geral) da Mulher, não
incluindo menopausa ou climatério no nome, a fim de
que o conhecimento, por parte do sujeito, do propósito
de algum estudo de que venha a utilizá-lo, pudesse ser
minimizado.
(25)
O QSM consta de 36 questões a respeito dos sinto-
mas e sensações experimentadas pelos sujeitos, ofere-
cendo quatro alternativas como possibilidade de respos-
ta: 1) Sim, sempre; 2) Sim, algumas vezes; 3) Não, não
muito (raramente); 4) Não, nunca.
Suas questões estão divididas em nove domínios,
dispostos aleatoriamente, que avaliam:
Humor depressivo (sete questões) - 3; 5; 7; 8; 10;
12; 25;
Sintomas somáticos (sete questões) - 14; 15; 16;
18; 23; 30; 35;
Memória/Concentração (três questões) - 20; 33; 36;
Sintomas vasomotores (duas questões) - 19; 27;
Ansiedade/temores (quatro questões) - 2; 4; 6; 9;
Comportamento sexual (três questões) - 24; 31; 34;
Distúrbios do sono (três questões) - 1; 11; 29;
Sintomas menstruais (quatro questões) - 17; 22;
26; 28;
Atratividade (autoestima) (três questões) - 13; 21; 32.
O escore do domínio é dado pelo somatório dos
pontos de cada sintoma (questão), reduzidos a uma
escala binária (Sim, sempre/Sim, algumas vezes = 1;
Não, não muito/Não, nunca = 0), dividido pelo núme-
ro de sintomas/questões de cada domínio. Sendo as-
sim, cada domínio terá um escore mínimo de 0 e um
máximo de 1, sendo 1 o maior grau de sofrimento ou
disfunção apresentado pelo sujeito frente àquele con-
junto de sintomas. Para algumas questões a pontuação
é invertida, conforme forem indagadas positivamente ou
negativamente. As questões cujas pontuações estão in-
vertidas são: 7, 10, 21, 25, 31 e 32. No caso do sujeito
não ser sexualmente ativo, as questões 31 e 34 do do-
mínio comportamento sexual devem ser desconsideradas.
As questões específicas sobre transtornos de humor
foram retiradas da escala de Leeds para ansiedade e
depressão,
(27)
que tem grande semelhança com a escala
de Hamilton para depressão.
(28,29)
Por não se tratar de um questionário discriminativo,
não faz diagnósticos específicos, mas possibilita o aces-
so a informações subjetivas. Em décadas de uso, já foi
amplamente utilizado em estudos sobre os sintomas do
climatério e mensuração de seu impacto no bem-estar da
paciente
(30,31)
e avaliação da resposta à Terapia Hormonal
do Climatério (TH).
(32)
De todos os sete instrumentos exis-
INFLUÊNCIA DO TEMPO DE MENOPAUSA NA QUALIDADE DE VIDA E SUA RELAÇÃO COM A MIGRÂNEA
16 Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012
MELO FILHO SS, VALENÇA MM
tentes com o propósito de avaliar QV na faixa etária do
climatério, uma recente revisão sistemática sobre a quali-
dade de suas propriedades psicométricas, considerou o
QSM como o questionário de mais alta pontuação.
(33)
Recentemente nós conduzimos um estudo descritivo,
comparativo e transversal, com mulheres na pós-meno-
pausa. As participantes foram divididas em dois grupos:
pós-menopausa recente (com tempo de pós-menopausa
menor que 5 anos) e pós-menopausa tardia (n=61, com
tempo de pós-menopausa maior ou igual a 5 anos e
menor que 15 anos). Avaliando-se o QSM, encontrou-
se um nível intermediário de QV, não havendo diferença
entre os dois grupos (p>0,05). Diferenças significativas
foram observadas quando analisados os domínios
memória/concentração (p<0,05), sintomas vasomotores
(p<0,05) e atratividade (p<0,05), tendo as mulheres
da pós-menopausa recente maiores médias dos escores.
A prevalência de cefaleia na amostra foi de 58%. Avali-
ando-se o MIDAS, não se encontrou associação entre o
grau de cefaleia e o tempo de menopausa. Porém, houve
aumento significativo dos escores QSM com o aumento
do grau de impacto da cefaleia no MIDAS para os
domínios da QV humor depressivo (p<0,05), sintomas
somáticos (p<0,05), sintomas vasomotores (p<0,05),
ansiedade/medo (p<0,05) e distúrbios do sono
(p<0,05). Assim, não houve diferença na QV global
quanto ao tempo de pós-menopausa, porém mulheres
na pós-menopausa recente tiveram pior QV quanto aos
sintomas vasomotores, ao déficit cognitivo e à auto-
estima. No entanto, de forma significativa, quanto mais
impacto tinha cefaleia primária, mais frequentes foram
os distúrbios do sono e as queixas físicas, vasomotoras e
relacionadas à ansiedade e depressão.
MigrâneaMigrânea
MigrâneaMigrânea
Migrânea
Segundo a Sociedade Internacional de Cefaleia
(SIC), a migrânea ou enxaqueca é um tipo de cefaleia
primária muito comum e capaz de produzir grande inca-
pacidade ao doente. A sua elevada prevalência tem sido
documentada por estudos epidemiológicos, bem como
o seu impacto socioeconômico e pessoal.
(4)
A migrânea
pode ser dividida em dois tipos principais:
Migrânea sem auraMigrânea sem aura
Migrânea sem auraMigrânea sem aura
Migrânea sem aura
Síndrome clínica caracterizada por cefaleia com
características especificas e sintomas associados. É o
subtipo mais comum de migrânea, com uma frequência
maior de ataques em comparação com o outro subtipo,
e usualmente mais incapacitante.
Caracteriza-se por uma cefaleia recorrente, com os
seguintes critérios diagnósticos:
A. Mínimo de cinco crises, preenchendo os critérios
B-D
B. Crises que duram de 4-72 horas (não tratadas
ou tratadas com sucesso)
C. Cefaléia que tem pelo menos duas das seguintes
características:
1. Localização unilateral
2. Caráter pulsátil
3. Dor de intensidade moderada ou severa
4. Agravada pelas atividades físicas de rotina, como
andar ou subir escadas, ou que causa
incapacidade frente a estas atividades.
D. Durante a cefaleia, a presença de pelos menos
um dos seguintes sintomas:
1. náusea e/ou vômitos
2. fotofobia e fonofobia
E. Que não seja atribuída a outra patologia.
Migrânea com auraMigrânea com aura
Migrânea com auraMigrânea com aura
Migrânea com aura
Desordem recorrente, que se manifesta em ataques
de sintomas neurológicos focais reversíveis (aura), que
usualmente surgem gradualmente dentro de 5 a 20
minutos e duram menos de 60 minutos. A aura típica
consiste de sintomas visuais e/ou sensoriais e/ou relativos
à fala. Cefaleia com as características da migrânea sem
aura usualmente segue os sintomas. Menos comumente,
a cefaleia não tem as características de migrânea ou
está ausente.
Alguns doentes também experimentam uma fase
premonitória, antecedendo em horas ou dias o apare-
cimento da cefaleia e ainda uma fase de resolução da
cefaleia. Os sintomas premonitórios e de resolução des-
critos são hiperatividade, hipoatividade, depressão,
apetite para determinados alimentos específicos, bocejos
repetidos e outros sintomas inespecíficos relatados por
alguns doentes.
Qualidade de vida na migrâneaQualidade de vida na migrânea
Qualidade de vida na migrâneaQualidade de vida na migrânea
Qualidade de vida na migrânea
A migrânea é um importante problema de saúde
pública, causador de grande ônus ao indivíduo e à
sociedade. A migrânea é uma das principais causas de
internamentos e absenteísmo nos Estados Unidos da
América (EUA), refletindo na economia daquele país.
A perda de produtividade relativa à migrânea custa aos
empregadores americanos cerca de 13 bilhões de
dólares por ano.
(34)
Há também um grande impacto na
utilização dos serviços de saúde. O National Ambulatory
Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012 17
Medical Care Survey, conduzido entre 1976 e 1977,
demonstrou que 4% de todas as visitas aos consultórios
de clínicos (cerca de 10 milhões por ano) foram por conta
de cefaleia.
(35)
A migrânea também resulta numa elevada
frequência de atendimentos em emergência nos EUA e
também no Brasil.
(36-38)
Uma grande quantidade de
medicamentos prescritos e um número ainda maior com-
prados diretamente no balcão são consumidos pelos ame-
ricanos todos os anos para tratamento das cefaleias.
(36)
As vendas de analgésicos comprados diretamente no
balcão nos EUA (para todos os tipos de dores) alcan-
çaram a marca de 3,2 bilhões de dólares em 1999 e a
cefaleia respondeu por aproximadamente um terço des-
sas vendas.
(39)
As vendas de triptanos totalizam cerca de
um bilhão de dólares por ano no EUA.
(39)
Em 2001, foi estimado que cerca de 28 milhões de
cidadãos americanos tinham crises graves de cefaleia.
Entre as mulheres americanas com migrânea, 25% experi-
mentavam quatro ou mais ataques intensos por mês; 48%
experimentavam entre um e quatro ataques intensos por
mês e 38% experimentavam menos que um ataque por
mês,
(40)
padrão semelhante ao que foi visto entre os
homens. Também foi demonstrado que 92% das mulheres
e 89% dos homens com migrânea intensa apresentavam
algum grau de invalidez temporária relacionada à cefa-
leia, e aproximadamente a metade dos casos se apre-
sentava gravemente incapacitada ou com necessidade
de repouso acamado.
(40)
Um grande número de paci-
entes migranosos com crises incapacitantes vive com
medo constante, sabendo que a qualquer momento um
ataque poderá comprometer a sua capacidade de
trabalhar, de cuidar de si próprio e de seus familiares e
de atender a compromissos sociais. Uma vasta quanti-
dade de evidências indica que a migrânea reduz a
QV.
(41,42)
Segundo a OMS, esse agravà a saúde está na
posição número 19 dentre todas as doenças que mais
causam invalidez em todo o mundo.
(4)
O questionário MIDAS (Migraine Disability Assessment)
foi criado para ajudar os médicos e pacientes na
avaliação das cefaleias primárias, em especial para a
avaliação da migrânea, para estabelecer uma relação
entre esta e a incapacidade por ela provocada. O seu
principal objetivo foi o de melhorar significativamente o
tratamento da migrânea
(43)
e indiretamente, avaliar o
impacto desta doença na QV dos seus portadores.
Os indivíduos com migrânea respondem a cinco
questões, atribuindo um valor ao número de dias, nos
últimos três meses, em que as suas atividades diárias
foram limitadas pela dor. O resultado do questionário
exprime-se numa pontuação, que se relaciona da seguinte
forma com as necessidades de tratamento:
I: Escore 0-5 – Incapacidade mínima ou pouco
frequente – necessidade terapêutica muito reduzida ou
não necessitam de tratamento.
II: Escore 6-10 – Incapacidade ligeira ou pouco
frequente – necessidade moderada de terapêutica.
III: Escore 11-20 – Incapacidade moderada –
necessidade de terapêutica.
IV: Escore 21 – Incapacidade grave – grau III e IV
de migrânea, necessidade terapêutica urgente.
(43)
Nos estudos completos até a data, o MIDAS reve-
lou-se inteiramente consistente, altamente confiável, váli-
do e correlacionado com o julgamento clinico dos mé-
dicos.
(44)
Essas características dão apoio ao uso do
MIDAS na pesquisa e na prática clínica. Com o intuito
de melhorar a assistência prestada, os portadores de
migrânea devem ser encorajados a procurar cuidados
médicos e falar sobre a sua doença. Por sua vez, médi-
cos devem realizar o diagnóstico específico, avaliar a
incapacidade provocada pela cefaleia e selecionar o
tratamento apropriado ao diagnóstico e ao grau de aco-
metimento. O MIDAS, portanto, pode desempenhar um
papel importante em iniciativas em saúde pública na
abordagem à migrânea.
Migrânea e os estrogêniosMigrânea e os estrogênios
Migrânea e os estrogêniosMigrânea e os estrogênios
Migrânea e os estrogênios
Os estrogênios exercem um efeito de facilitação com
os sistemas serotoninérgicos e glutamatérgicos. O tônus
serotoninérgico nas mulheres está diretamente propor-
cional aos níveis de estrogênios circulantes. Estudos em
animais mostraram que os estrogênios alteram o tônus
serotoninérgico.
(9)
Quando a concentração destes hormô-
nios declina, as concentrações de serotonina acompa-
nham a queda, devido à combinação entre um declínio
da sua produção e aumento na sua taxa de excreção.
Os estrogênios modulam o metabolismo da serotonina
ao afetar a expressão da triptofano-hidroxilase, a enzima
limitante da síntese de serotonina, bem como das mono-
amino-oxidases A e B, enzimas responsáveis pela degra-
dação da serotonina. O número de transportadores de
recaptação de serotonina na fenda sináptica é modi-
ficado pela duração à exposição aos estrogênios. Os
estrogênios também modulam a sensibilidade dos
receptores 5-HT1 e 5-HT29.
A diminuição resultante da função serotoninérgica
está relacionada com a liberação do peptídeo relacio-
nado ao gene da calcitonina e da substância P pelos
nervos trigêmeos, que levam à dilatação dos vasos crani-
INFLUÊNCIA DO TEMPO DE MENOPAUSA NA QUALIDADE DE VIDA E SUA RELAÇÃO COM A MIGRÂNEA
18 Headache Medicine, v.3, n.1, p.13-20, Jan./Feb./Mar. 2012
MELO FILHO SS, VALENÇA MM
anos e sensibilização dos aferentes meníngeos do trigê-
meo.
(45)
Estrogênios também afetam outros mediadores
químicos, como o óxido nítrico, o magnésio e prosta-
glandinas, que têm a capacidade de modular o balan-
ço entre a neurotransmissão excitatória e inibitória.
(9,46)
Diante disso, não é de se estranhar que crises de
migrânea possam ser desencadeadas em mulheres sus-
cetíveis quando há flutuação dos níveis estrogênicos. Pela
2ª edição da Classificação Internacional das Cefaleias
da SIC, a migrânea menstrual é considerada um subtipo
de migrânea sem aura que está relacionada aos este-
roides ovarianos. A migrânea menstrual é definida como
crises de migrânea que ocorrem nos dias -2 e +3 do
ciclo menstrual, considerando o dia +1 como sendo o
primeiro dia da menstruação.
(4)
Acredita-se que nos períodos pré-menstrual e mens-
trual, fases do ciclo menstrual em que os níveis estro-
gênicos encontram o nadir, a queda da concentração
sérica destes hormônios seja o gatilho para o surgimento
das crises álgicas. Mulheres com migrânea menstrual
parecem ter um resposta anormal ao declínio fisiológico
dos níveis de estradiol.
(47)
Nelas, a estabilização dos níveis
estrogênicos por período prolongado parece proteger
contra a migrânea.
Dados epidemiológicos dão conta dessa influência
dos estrogênios sobre a migrânea. A prevalência de
migrânea em países ocidentais é maior em mulheres do
que em homens (18% versus 6%).
(48)
Além disso, em 33%
das mulheres, a migrânea se inicia após a menarca,
(49)
tende a piorar no primeiro trimestre da gravidez e a
melhorar nos últimos dois trimestres.
(50)
Mais de 60% das
mulheres com migrânea relatam associação das crises
com a menstruação.
(51)
Não há evidências de que os
outros tipos de cefaleias primárias (tipo tensional ou em
salvas) possam ser influenciados pelos níveis de estro-
gênios.
Migrânea e climatérioMigrânea e climatério
Migrânea e climatérioMigrânea e climatério
Migrânea e climatério
A migrânea apresenta clara tendência de melhora
nas mulheres após os 55 anos de idade, período que,
em geral, coincide com o início da pós-menopausa
tardia, pelo menos em parte, devido à estabilização dos
níveis hormonais.
(49,52)
Além disso, a prevalência de migrâ-
nea é maior durante a transição menopausal (quando
há início da falência ovariana) do que durante a pós-
menopausa recente, particularmente em mulheres com
história de migrânea menstrual.
(53)
Mesmo em pacientes
mais idosos, a cefaleia é ainda mais comum em mulheres
do que em homens. As mulheres tendem a apresentar
mais crises com auras e, ainda, as crises são mais prolon-
gadas do que em homens.
(40,54)
Alguns estudos relataram
que mulheres submetidas à menopausa cirúrgica experi-
mentavam mais provavelmente uma piora das suas crises
de migrânea, em relação às mulheres que tiveram meno-
pausa natural.
(55,56)
O uso de anticoncepcionais orais e
da TH podem piorar a migrânea ou mudar suas caracte-
rísticas.
(57,58)
O Women's Health Study relatou uma preva-
lência de 11% de migrânea entre 17.107 profissionais
de saúde menopausadas (destas 39% nunca fizeram uso
de TH, enquanto 61% eram usuárias no momento de
TH).
(59)
Foi relatado um odds ratio para migrânea de
1,42 (95% IC 1,24 - 1,62) para as usuárias, comparadas
às que nunca utilizaram TH, após ajustados os fatores
de confusão.
DISCUSSÃO
É clara a relação que os estrogênios têm com a
fisiopatogenia da migrânea. Mudanças no padrão das
crises já foram bem documentadas durante períodos da
vida da mulher em que há grande oscilação dos níveis
estrogênicos, como a gravidez e os extremos da vida
reprodutiva – menarca (marco dos primeiros ataques de
migrânea em quase um terço das mulheres) e climatério.
Este último é uma etapa da vida feminina que deve
receber especial atenção daqueles que se dedicam à
saúde da mulher e ao estudo das cefaleias. As evidências
apontam para um agravamento das crises, em frequên-
cia e intensidade, na perimenopausa e pós-menopausa
recente, enquanto que, na pós-menopausa tardia, há
diminuição da gravidade da doença, dada à progressiva
diminuição e estabilização dos níveis estrogênicos (consi-
derando apenas mulheres que não usam TH). No en-
tanto, mesmo em situação de hipoestrogenismo, um per-
centual ainda considerável das mulheres é acometido
pela migrânea (11%, contra os 18% de prevalência vista
durante os anos de vida reprodutiva). Possivelmente, se
considerássemos apenas as mulheres no climatério que
não fazem uso de TH, a prevalência de migrânea nesta
faixa etária seria menor. Não podemos, todavia, esquecer
o considerável número de usuárias deste tipo de terapia
em nosso meio, frente aos benefícios já bem estabelecidos
da TH do climatério sobre a QV.
Reconhecidamente, nas mulheres que não fazem uso
de TH, os sintomas inicialmente causados pelo hipoestro-
genismo, como os fogachos e as ondas de sudorese notur-
na (que provocam insônia, que, por sua vez, leva a sinto-
mas como irritabilidade, impaciência, sonolência durante
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o dia, dificuldade de concentração), quando aliados à
ansiedade e tendência ao humor depressivo, típicos da
perimenopausa e dos primeiros anos de pós-menopausa
podem levar a interferência no bem-estar. De outro lado,
na pós-menopausa tardia, os sintomas decorrentes do
hipoestrogenismo em longo prazo, como a diminuição
da libido e a atrofia da mucosa vaginal e uretral (indu-
toras de desconforto nas relações sexuais), podem levar
ao desinteresse pela atividade sexual. A perda progressiva
da densidade mineral óssea, culminando em osteoporose
(que quando avançada pode ocasionar fraturas pato-
lógicas) e os processos degenerativos articulares e mus-
culares provocando dores no corpo e fadiga são sintomas
comuns desta fase.
As evidências dão conta de uma piora da QV no
climatério, mas não há dados que apontem se há
mudança na QV com o passar dos anos. Caso haja
mudança da QV com o tempo de menopausa, é possível
que a migrânea possa ser preponderante para isso.
Porém, esse aspecto ainda não foi adequadamente
avaliado. Tendo em vista o grande impacto provocado
pela migrânea na QV e a maior morbidade da doença
na transição menopausal e pós-menopausa recente, é
possível que, havendo mudança na QV, esta seja pior
durante este período. Saber as peculiaridades de cada
fase da pós-menopausa, entendendo exatamente o que
afeta o bem-estar das mulheres, poderá ajudar a
melhorar a assistência a saúde delas.
CONCLUSÃO
Mesmo após décadas de estudo sobre este tema,
ainda há necessidade de trabalhos que possam elucidar
alguns pontos ainda nebulosos sobre o climatério e, em
especial, sobre a QV neste período. Estudos observa-
cionais poderiam ser implementados com o objetivo de
avaliar possíveis diferenças na QV entre as duas fases
da pós-menopausa e averiguar se a incapacidade provo-
cada pela migrânea tem relação com as eventuais
diferenças encontradas.
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MELO FILHO SS, VALENÇA MM
Recebido: 8/1/2012
Aceito: 28/2/2012