Headache Medicine, v.8, n.2, p.55-57, Apr./May/Jun. 2017 55
Medications we miss in headache treatment in Brazil
Medicamentos que sentimos falta no Brasil para o tratamento das cefaleias
Mario Fernando Prieto Peres
1
, Marcelo Moraes Valença
2
1
Hospital Albert Einstein, São Paulo, SP, Brasil
2
Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
Peres MFP, Valença MM. Medications we miss in headache treatment in Brazil. Headache Medicine. 2017;8(2):55-7
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RESUMO
Algumas opções para o tratamento medicamentoso que são
úteis e desejáveis na prática clínica nas cefaleias são indis-
poníveis no nosso meio como a metisergida, indometacina
endovenosa, melatonina, Petasites hybridus, proclorperazina,
dihidroergotamina, aspirina endovenosa e novos triptanos.
É necessária uma mudança nas políticas públicas de apro-
vação de fármacos levando em conta as necessidades dos
pacientes em primeiro plano e não as questões financeiras.
Palavras-chave: Enxaqueca; Tratamento farmacológico,
Brasil
ABSTRACT
There are some options for the treatment with drugs that are
useful and desirable in clinical practice in Headache Medicine,
which are no available to the Brazilian doctors, such as
methysergide, intravenous indomethacin, melatonin, Petasites
hybridus, prochlorperazine, dihydroergotamine, intravenous
aspirin and new triptans. There is a need for a change in
public drug approval policies taking into account the needs
of our patients rather than financial issues.
Keywords: Migraine; Drug treatment; Brazil
INTRODUÇÃO
As cefaleias primárias afetam no Brasil uma porcenta-
gem substancial da população.
(1-3)
O acesso e aderência
aos tratamentos se limitam devido à sua tolerabilidade e
disponibilidade. Neste artigo discutimos as opções de tra-
tamento medicamentoso que são úteis e desejáveis na prá-
tica clínica nas cefaléias, mas indisponíveis no nosso meio
como nos exemplos da metisergida, indometacina
endovenosa, melatonina, Petasites hybridus, proclor-
perazina, dihidroergotamina, aspirina endovenosa e no-
vos triptanos.
Metisergida
Metisergida é um derivado do ergot que tem ampla
utilização na área das cefaleias,
(4)
tem ação farmacológica
em receptores de serotonina, antagonista 5HT
2B
e 5HT
2C
,
e agonista parcial de receptores 5HT
1A
. É metabolizada
em metilergometrina em humanos. Foi primeiramente apro-
vada pelo FDA em 1962, mas após a companhia farma-
cêutica Novartis ter adquirido a Sandoz retirou-a do mer-
cado mundial.
Além do uso em cefaleias, é também utilizada em
síndrome carcinoide para tratar diarreia. Em estudo recen-
te em membros da Sociedade Internacional de Cefaleias,
sobre o uso da metisergida, 79,8% relataram que prescre-
veriam a medicação se fosse disponível, considerando a
única e insubstituível opção para uma população de paci-
entes específica de cefaleia em salvas e enxaqueca refratá-
rios a tratamentos convencionais, a posição da Sociedade
Internacional foi de uma necessidade urgente da continui-
dade de sua disponibilidade.
(5)
O risco de fibrose
retroperitoneal não foi relatado como complicação frequen-
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PERES MFP, VALENÇA MM
te ou como preocupação que evitaria a prescrição da
metisergida. No Brasil a metisergida foi retirada do merca-
do, mas estima-se que na prática clínica uma parcela de
pacientes considerável sofre com a sua ausência.
Indometacina
Indometacina é um anti-inflamatório com ação es-
pecial em certas cefaleias primárias, constituindo até um
grupo chamado de cefaleias indometacino-responsivas,
hemicrania continua, hemicrania paroxística episódica e
crônica, cefaleias do esforço, cefaleia da tosse, cefaleia
da atividade sexual.
(6)
Vários mecanismos de ação são
propostos para o efeito da indometacina nas cefaleias,
além da inibição não seletiva da ciclo-oxigenasse 1 e 2.
Recentemente também foi considerada como provável me-
canismo de ação sua similaridade molecular com a
melatonina.
(7)
Uma das bases diagnósticas na área das
cefaleias é o indotest, com injeção intramuscular ou
endovenosa para se avaliar a resposta clínica de melhora
na dor do paciente. A indometacina é disponível no Bra-
sil em comprimidos na dose de 50 mg, mas é indisponí-
vel na sua formulação parenteral, endovenosa ou
intramuscular, para adultos.
(8)
A disponibilidade da
indometacina parenteral seria de grande interesse e im-
portância para os médicos que tratam pacientes que so-
frem com dores de cabeça.
Melatonina
A melatonina é uma indoleamina produzida pela
glândula pineal, responsável pela sincronização dos rit-
mos biológicos nos animais incluindo em seres humanos.
A melatonina vem sendo implicada como participante dos
mecanismos relacionado a gênese de cefaleias primárias
e secundárias, como enxaqueca, cefaleia em salvas,
cefaleia hípnica,
(9)
e vem sendo estudada como forma de
tratamento preventivo para enxaqueca,
(10)
e cefaleia em
salvas.
(11)
Melatonina não é medicação proibida, mas ainda não
tem, até a data de envio deste manuscrito, a aprovação
para seu uso. Discute-se a forma de aprovação como vita-
mina, igualmente ocorre nos Estados Unidos e Canadá,
como medicamento sem receita ou como parte da portaria
344, necessitando prescrição médica. Devido ao seu per-
fil extremamente benigno, sem dose letal, já exaustivamen-
te estudada em seus efeitos colaterais sem observar-se ne-
nhum clinicamente relevante, com eficácia consolidada
em diversas indicações, na prevenção da enxaqueca e
cefaleia em salvas especialmente, a sua disponibilidade
no nosso país já demora em ocorrer.
Petasites Hybridus
O Petasites hybridus é uma planta perene da família
das asteracea, nativa da Europa e Ásia, conhecida no
exterior como o butterbur, é o composto fitoterápico me-
lhor estudado na prevenção da enxaqueca, com nível de
evidência A. O medicamento é disponível em vários países
do mundo, como na América do Norte e Europa. No Bra-
sil já foi disponível, no seu extrato Ze339, posicionado
para o tratamento da rinite alérgica (Antilerg), porém reti-
rado do mercado por questões estratégicas da empresa.
Sendo eficaz e bem tolerado na prevenção da enxaque-
ca
(12)
e também pelo seu potencial de tratamento nas rinites
alérgicas que podem estar associadas às enxaquecas em
um número representativo de pacientes,
(13)
a disponibilida-
de deste composto é desejável para o nosso meio.
Proclorperazina
A proclorperazina é uma droga neuroléptica típica,
da classe dos fenotiazídicos, utilizada para o tratamento
agudo da enxaqueca, náusea, psicose e vertigem.
(14)
Tem
ação bloqueando receptores dopaminérgicos D
2
. Pela sua
grande escala de uso nos Estados Unidos e Europa, eficá-
cia e segurança, a disponibilidade da proclorperazina como
medicação de uso via oral, retal ou parenteral teria espaço
no leque terapêutico das cefaleias.
Dihidroergotamina (DHE)
DHE é um derivado do ergot, amplamente utilizado
como tratamento agudo para enxaqueca, mesmo com a
descoberta dos triptanos, permanece como base dos pro-
tocolos de desintoxicação sendo utilizado tanto por via
endovenosa quanto por via intramuscular.
(15)
DHE foi um
dos primeiros medicamentos utilizados na história que mu-
dou o rumo do tratamento das enxaquecas em unidades
de emergência e em situações de gravidade com necessi-
dade de uso parenteral.
(16)
No Brasil, o DHE parenteral
nunca foi disponível.
Aspirina endovenosa
O ácido acetilsalicílico endovenoso foi testado com óti-
mo eficácia e boa tolerabilidade no tratamento agudo e
hospitalar em pacientes com cefaleias,
(17)
a alta eficácia com
o baixo nível de efeitos colaterais observados na aplicação
endovenosa de aspirina a colocam como ótima opção tera-
pêutica. Porém não se encontra disponível no Brasil.
Novos Triptanos
Estão disponíveis no Brasil apenas quatro triptanos,
i.e. naratriptano, zolmitriptano, sumatriptano e rizatriptano,
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mas em outros países outros medicamentos da classe exis-
tem como o frovatriptano, eletriptano, almotriptano,
avitriptan e donitriptan,
(18)
além das formulações injetáveis
com tecnologia mais moderna de aplicação subcutânea e
transdérmica do sumatriptano. Apesar de termos já apro-
vados quatro triptanos, a disponibilidade de novas opções
e formulações seria desejável.
DISCUSSÃO
A aprovação e disponibilidade das medicações não
seguem o critério principal que é a sua utilidade e necessi-
dade clínica. Políticas públicas de saúde devem levar em
conta este critério, e as agências reguladoras deveriam de-
legar parte do processo de aprovação a sociedades de
classe ou estabelecer algum outro critério que levem em
conta o usuário final, o paciente, e não apenas o interesse
comercial da indústria farmacêutica. A sociedade – médi-
ca e leiga – deve se mobilizar nesta direção.
CONCLUSÃO
Uma série de medicamentos não se encontram dis-
poníveis em nosso meio, mas seriam de grande ajuda no
aumento do leque de opções terapêuticas para as cefaleias.
É necessária uma mudança nas políticas públicas de apro-
vação de fármacos levando em conta as necessidades
dos pacientes em primeiro plano e não as questões finan-
ceiras.
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Correspondência
Mario Fernando Prieto Peres
Hospital Albert Einstein
São Paulo, SP, Brasil
MEDICATIONS WE MISS IN HEADACHE TREATMENT IN BRAZIL
Recebido: 06 de outubro de 2016
Aceito: 30 de março de 2017