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eadache Medicine, v.2, n.4, p.204-208, Oct/ Nov/Dec. 2011
Síndrome musculoarticular superior
Superior articular muscle syndrome
RESUMORESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
Uma alta porcentagem de pessoas de todas as idades sofre
de tonturas, dores de cabeça e sintomatologias na região
cervical, cintura escapular, braços e mãos. A medicina diag-
nostica esses sintomas como doenças crônicas e se limita a
combater a sintomatologia com analgésicos, anti-inflamatórios
e relaxantes musculares, que o paciente passa a consumir
regularmente durante anos. Interpretamos que todas essas
regiões pertencem a um mesmo sistema, que chamamos de
musculoarticular superior (MAS). A mandíbula é o centro
fisiológico do mesmo. Assim o certificam as funções nas quais
participa (fonação, deglutição e mastigação), a amplitude
de movimentos que realiza, e a grande quantidade de mús-
culos que nela se inserem. As posições excêntricas tanto para
as funções como em repouso modificam a sincronização do
sistema, determinando a aparição de sintomatologia em uma
ou várias regiões que compõem o sistema. Este conjunto de
sintomas associados a uma mesma causa caracteriza a
síndrome. As conclusões do trabalho clínico aqui apresentado
mostram os sintomas relacionados e as porcentagens de
prevalência dos mesmos.
PP
PP
P
alavrasalavras
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alavras
--
--
-
chave:chave:
chave:chave:
chave: Mandíbula; Dor; Cefaleia
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT
A high percentage of people of every age sufer, sickness,
headache and symptomatology in the neck, waist, arms and
hands. The Medical Institution diagnoses these symptoms as
chronic sickness, and it limits to fight the symptomatology
with analgesic, anti-inflamatorys and muscular relaxings who
the patient consume-regularly during years. We interpret of
all these regions belong to a same system, that we call Upper
Articulated Muscle (UAM ). Jaw is the phisiological centre of
itself. This certify the functions which take part phonation,
swallowing and mastication, the movement that it executes,
and a large number of muscles which inserts in it. The eccentric
positions in the functions and in the rest modify the
sincronization´s system determining the symptomatology
ORIGINAL ARTICLEORIGINAL ARTICLE
ORIGINAL ARTICLEORIGINAL ARTICLE
ORIGINAL ARTICLE
Miguel Angel Siderman
Cirurgião dentista. RS, Brasil
Siderman MA. Síndrome musculoarticular superior. Headache Medicine. 2011;2(4):204-8
INTRODUCTION
A relação entre distúrbios têmporo-mandibulares e
distúrbios da região cervical tem sido motivo de nume-
rosos trabalhos de investigação. Alguns citam a co-
existência,
(1-5)
outros mostram como disfunções na região
cervical podem desencadear dores na região da cabe-
ça,
(6-13)
as contraturas suboccipitais podem ser acom-
panhadas de dores irradiadas em direção à região
frontal e lateral da cabeça,
(14-18)
e, por último, encon-
tramos autores que relatam que pacientes portadores
de distúrbios têmporo-mandibulares (DTM) se queixa-
vam de dor no pescoço.
(4,5,8,19)
Embora esses estudos mostrem evidências de que
os distúrbios DTM e os distúrbios cervicais se apresentem
associados, não concluem definindo as causas ou meca-
nismos que os provocam.
Na prática é possível identificar uma alta porcen-
tagem de pacientes afetados por dores de cabeça e
sintomatologia cervical, que consultam diferentes tipos
de especialistas na busca de soluções que não aparecem,
condenados a conviver com diagnósticos de supostas
doenças crônicas (enxaquecas, bico de papagaio,
hérnias), e a ingerir medicamentos permanentemente, na
busca do alívio à dor.
appearance in one or several regions which compose the
system. All these associated symptoms in a same cause
characterize the syndrome.The conclusion of this clinical job
here presented show the related symptons and the percentages
of protrude of themselves.
KK
KK
K
eywords: eywords:
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eywords: Jaw; Pain; Headache
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As publicações que tratam do tema mencionam a
existência de um sistema crânio-cérvico-facial (cabeça e
pescoço), o que consideramos um erro. Analisando a
região encontramos músculos importantes que têm
inserção em: escápula, esterno, clavícula e costelas, isso
significa que devemos incorporar a cintura escapular ao
sistema.
Do ponto de vista neurológico, se analisamos a
inervação que transita pela coluna cervical e as regiões
que são inervadas podemos incluir também os membros
superiores ao sistema (Figura1).
O homem moderno, por diversos motivos, costuma
apresentar hipofunção (não desenvolve os maxilares,
dando como consequência apinhamento dental), fluo-
ração das águas, uso de restaurações metálicas e de
porcelana, não conta com o elemento fusível, achando
interferências que levam a mandíbula a posições excên-
tricas, geralmente em direção à frente e a um lado, obri-
gando a musculatura de todo o sistema a compensar
essa situação.
A musculatura cervical posterior, que se encarrega
do equilíbrio ântero-posterior da cabeça, se contrai para
compensar o peso da mandíbula e de toda a massa
muscular que acompanha as posições excêntricas (Figura
2). Aparecem assim as contraturas cervicais e a sinto-
matologia ocasionada por essa situação.
Dessa maneira podemos associar sintomatologia de
cabeça, pescoço, cintura escapular e membros superiores
a uma única causa, posição excêntrica da mandíbula,
definindo assim o que chamamos de Síndrome Musculo-
articular Superior.
Definimos também a posição fisiológica harmônica
da mandíbula como aquela em que toda a musculatura
do sistema se encontra equilibrada, sem contraturas
compensatórias.
É importante definir a existência da síndrome, já que
isto nos permite tratar pacientes com afecções crônicas
cervicais, ou em membros superiores, através do reposi-
cionamento da mandíbula.
Figura 1. Inervação de braços e mãos que provêm de espaços cervicais
C5, C6, C7, C8.
Definimos assim o que chamamos de Sistema
Musculoarticular Superior, composto por cabeça,
pescoço, cintura escapular e membros superiores.
A importância deste conceito radica em que a
sintomatologia relacionada com estas estruturas pode
responder a uma única causa que afete todo o sistema,
caracterizando assim a presença de uma síndrome.
A importância da mandíbula dentro desse sistema é
evidente, basta analisar a grande quantidade de mús-
culos e ligamentos que nela se inserem, e seu desem-
penho funcional na mastigação, fonação e deglutição,
graças à grande amplitude de movimentos que pode
realizar.
Qualquer interferência que guie a mandíbula a
posições excêntricas tem que ser compensada pela
musculatura de todo o sistema.
Para que a mandíbula atue livre de interferências, a
natureza criou um elemento fusível, o dente, que se
desgasta, e é assim em várias espécies animais.
Figura 2. Musculatura que intervém no equilíbrio ântero-posterior da
cabeça, e sistema muscular que se associa à parte inferior da
mandíbula.
SÍNDROME MUSCULOARTICULAR SUPERIOR
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SIDERMAN MA
APLICAÇÃO CLÍNICA DA SÍNDROME
Começamos elaborando um protocolo de anamnese
e exame clínico, onde incluímos cabeça, ouvidos,
pescoço, cintura escapular e membros superiores.
A anamnese está baseada na descrição da sinto-
matologia da cabeça, ouvidos, cérvico-escapular, braços,
mãos e equilíbrio.
O exame clínico consta de palpação dos músculos
masseteiros, temporais, pterigoideos, suboccipitais,
trapézios, escalenos e esternocleidomastoidio. Também
palpação na região de ATM, análise de trajetória e
capacidade de abertura.
Este protocolo nos permite obter, em poucos minutos,
uma visão global do sistema MAS.
Na boca analisamos o espaço interoclusal livre,
auxiliados com laminilhas de Long.
Completamos, em alguns casos, com estudo em
articulador semiajustável, com modelo inferior com dentes
posteriores troquelados individualmente, o que nos
permitiu analisar as interferências, uma a uma.
As correções foram realizadas com ajustes, exo-
dontias, ortodontia e prótese.
Foram utilizadas placas interoclusais, em alguns
casos, só para aliviar sintomatologia aguda, na primeira
parte do tratamento.
Aconselhamos os pacientes a suprimir o uso de
medicamentos na medida em que o tratamento avança.
Considerávamos os casos concluídos quando
cessava a sintomatologia em períodos sempre superiores
a um mês. Também realizamos controles à distância,
contando com pacientes que já superam um ano de
tratamento.
Durante 18 meses tratamos 29 pacientes (Tabela 1)
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sempre obtendo êxito. No fim do tratamento, realizamos
entrevistas filmadas, onde cada um relata sua história
clínica completa, descrevendo sintomatologia, exames,
profissionais consultados e tratamentos realizados,
durante os anos de convalescimento.
Com base nas anamnese e nas entrevistas, elabo-
ramos um quadro de sintomatologia, no qual apa-
recem as porcentagens de prevalência de cada
sintoma.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
O exame do quadro de resultados nos leva às
seguintes conclusões;
1) A sintomatologia cervical, associada aos braços
e mãos, junto com dores de cabeça, estava presente em
90% dos pacientes tratados. Ressaltamos que desapa-
receram depois do tratamento dental. O que comprova
a existência da síndrome de MAS.
2) O cansaço, manifestado por 82,75% dos paci-
entes, vem como consequência da atividade muscular
forçada.
3) Zumbidos e equilíbrio, com 62% com sintomas
frequentes, e devemos incluí-los na anamnese.
4) Apesar das desarmonias oclusais, presentes em
todos os casos, só 48% tiveram manifestações de ATM e
28% com bruxismo.
5) O resto da sintomatologia só apareceu em casos
com dores agudas, ou contraturas musculares crônicas,
com limitação de movimentos.
DISCUSSÃO
O homem moderno padece frequentemente de
sintomatologias crônicas nas regiões da cabeça, pescoço,
cintura escapular e braços.
Temos assim dores na região da cabeça, às que a
medicina chama enxaquecas ou migrânias. Dores
cervicais, justificadas pela presença de hérnias ou bico
de papagaio (deformação das vértebras, causada por
compressão). Zumbido nos ouvidos; tonturas e dese-
quilíbrios, diagnosticados como labirintite. Adorme-
cimento ou diminuição de mobilidade nos braços e mãos,
diagnosticados como contraturas tencionais, ou lesão por
esforço repetitivo – LER.
O certo é que as pessoas passam a conviver com
afecções consideradas crônicas e tratadas com anal-
gésicos, anti-inflamatórios e relaxantes musculares, para
aliviar os sintomas que elas provocam.
A especialização da medicina leva a que o otorrino
trate o zumbido, o traumatologista o pescoço, o neuro-
logista as dores de cabeça e as tonturas e o dentista os
dentes e a ATM.
O diagnóstico obtido através da análise de estruturas
ósseas e articulares, exame passivo (radiográfico), nos
leva a diagnosticar lesões que consideramos irreversíveis
e a pensar que são crônicas.
A medicina esqueceu o músculo, que é quem deter-
mina onde cada estrutura vai se posicionar, e do conceito
da sincronização muscular, onde toda a musculatura
trabalha associada.
O médico examina radiografias de coluna e não
palpa a musculatura, que é a que posiciona a vértebra,
e, portanto, não consegue interpretar a causa que pro-
vocou a lesão, geralmente associada a uma contratura
muscular.
A importância de poder observar o paciente de
forma global e funcional nos ajudará a resolver muitas
das afecções que se consideram crônicas. Prova do que
estou afirmando é que cresce cada vez mais a aplicação
da fisioterapia, como terapia alternativa.
O conceito fisiológico de sistema musculoarticular
superior nos leva a compreender a importância de esta-
belecer equilíbrio e harmonia para os músculos que o
compõem.
A mandíbula é o centro ósseo móvel que comanda
as funções mais importantes do sistema, fonação, mas-
tigação e deglutição. Além do mais, sua posição em
repouso exige a coordenação de todo o sistema muscular
superior de cabeça e pescoço. Cabe ao odontólogo
interpretar qual é a posição funcionalmente correta, que
não provoque desarmonias nas estruturas que o
compõem.
O dente funciona como fusível do sistema, já que se
desgasta. Foi assim no homem primitivo e é assim em
outras espécies. Substituir essa estrutura dental por
elementos mais duros e resistentes é um erro filosófico
que temos cometido na profissão.
Devemos analisar um pouco mais nossos princípios
reabilitadores. Não é possível que, ao terminar nossos
tratamentos, fiquemos satisfeitos por termos conseguido
lindos sorrisos fotográficos, mas condenados a usar uma
placa interoclusal noturna.
Interpretar a natureza e cuidar da qualidade de vida
de nossos pacientes é sem duvida o nosso objetivo. Está
em nossas mãos a solução de muitas das afecções
crônicas de cabeça, pescoço e braços. Devemos divulgar
estes conhecimentos para que a medicina os possa
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Headache Medicine, v.2, n.4, p.204-208, Oct/ Nov/Dec. 2011
Correspondência
Miguel Angel Siderman, MDMiguel Angel Siderman, MD
Miguel Angel Siderman, MDMiguel Angel Siderman, MD
Miguel Angel Siderman, MD
miguel.siderman@hotmail.com
Recebido: 11 /27/2010
Aceito: 10/13/2011
diagnosticar como sintomas curáveis, e não como
doenças crônicas.
CONCLUSÃO
A definição de sistema musculoarticular superior
(MAS) e a influência que as posições excêntricas da
mandíbula exercem neste ficam claramente registradas
no trabalho apresentado neste artigo. Pacientes com
sintomas dolorosos crônicos em cabeça, pescoço, cintura
escapular e braços relataram o desaparecimento de suas
afecções depois de serem submetidos ao tratamento
odontológico de reposição mandibular.
Definimos então como síndrome musculoarticular
superior – SMAS, provocados por uma única causa, a
posição excêntrica da mandíbula.
É importante interpretar como a natureza resolve
nossas necessidades funcionais, estática (equilíbrio) e
dinâmica (fonação, deglutição e mastigação) para poder
tratar as patologias musculares crônicas.
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